
fim da guerra. trump vendeu essa frase como se fosse um hambúrguer frio no estacionamento de um cassino. e o mundo comprou. manchetes, editoriais, comentaristas exaustos repetindo a mesma ladainha… “acordo histórico”, “vitória da diplomacia”, “nova era no oriente médio”. não era nada disso. era só o velho truque do mágico cansado… tira o lenço do bolso, distrai o público, esconde o coelho morto. trump, aquele eterno mascate de catástrofes, fez o que sempre faz pegou uma tragédia, colocou sua assinatura dourada em cima, e vendeu como milagre. o problema é que dessa vez, o preço é sangue humano.
mas o espetáculo não começou nem terminou nele. o acordo, esse teatrinho de palavras e promessas, nasceu da velha combinação de desespero, oportunismo e marketing político. de um lado, israel pressionado por meses de críticas internacionais, exausto com o peso da própria brutalidade. do outro, hamas tentando transformar sobrevivência em narrativa de vitória. entre eles, diplomatas americanos com pressa de escrever comunicados de imprensa e buscando o nobel da paz para seu líder. e no meio, a população de gaza, reduzida a estatística, empurrada pra um tipo de limbo que o mundo chama de “trégua”.
as ruas cobertas de pó, os prédios como dentes quebrados e o ar com aquele gosto de ferro e cinza. israel anunciou que as tropas recuariam “gradualmente”, o que na prática significa deixar tanques estacionados em pontos estratégicos… prontos pra avançar de novo, se algum político precisar lembrar o eleitorado de quem manda. o acordo prevê “ajuda humanitária” entrando em gaza, mas a ajuda sempre vem carimbada, chega sob escolta militar, com inspeções, atrasos e regras. cada pacote de arroz precisa de permissão. cada litro de combustível é um favor.
o mundo se comove com a troca de reféns. israelenses libertos, palestinos libertos, lágrimas televisionadas, drones filmando abraços. mas toda libertação tem bordas sombrias… por cada prisioneiro libertado, há milhares que continuam presos, sem julgamento, sem nome, sem história. e no caso palestino, a prisão se estende pra além das celas… está no bloqueio, nas fronteiras fechadas, nos céus vigiados. liberdade em gaza é sempre uma licença temporária.
o governo israelense, ainda inflado de paranoia e poder, não perdeu tempo em dizer que o cessar-fogo não significava o fim da guerra. foi como jogar um balde de água fria sobre a euforia cuidadosamente roteirizada. “manteremos o direito de agir militarmente se for necessário.” essa frase sozinha destrói qualquer ilusão de paz. porque no léxico de quem ocupa, “necessário” é uma palavra elástica, serve pra bombardear escolas, fechar hospitais, demolir casas inteiras em nome da segurança.
enquanto isso, as agências internacionais se esforçam pra parecer úteis. promessas de reconstrução surgem como ervas daninhas… cada país doador querendo fincar sua bandeira em algum projeto simbólico. o catar quer financiar estradas, a turquia quer hospitais, os estados unidos prometem milhões que nunca chegam. e todo mundo exige relatórios, planilhas, transparência, como se fosse possível medir a dor em planilhas. reconstruir gaza virou uma indústria, um negócio com prazo e margem de lucro. a guerra, como tudo, aprendeu a se monetizar.
o que realmente não mudou, o que nunca muda, é a estrutura invisível que mantém o conflito respirando. o bloqueio continua, a vigilância continua, a ocupação continua. as crianças que nasceram durante os bombardeios agora brincam entre os escombros, aprendendo a distinguir o som de drones como quem aprende o alfabeto. professores tentam dar aula em escolas sem teto. médicos improvisam cirurgias em corredores. e o mundo, com sua moral de ocasião, continua discutindo “proporcionalidade”, como se a morte pudesse ser medida em tabelas.
na televisão, especialistas falam sobre “avançar com cautela”, “construir pontes”, “renovar o diálogo”. expressões limpas, confortáveis, que não sujam a boca de quem as pronuncia. ninguém menciona o fato de que as fronteiras continuam fechadas, que a água continua contaminada, que as famílias continuam enterrando os mortos com pás emprestadas. o mundo gosta de discursos sobre paz, mas não suporta a logística dela. paz dá trabalho, exige ceder, exige memória e ninguém ali quer lembrar.
e aí está o detalhe mais cruel, o tempo. o tempo transforma tudo em costume. o horror se normaliza, o sofrimento se torna ruído de fundo. os noticiários mudam de tema, as câmeras vão embora, e o povo de gaza continua onde sempre esteve esperando, reconstruindo, desmoronando de novo. é uma coreografia repetida tantas vezes que já virou reflexo: bombardeio, cessar-fogo, reconstrução, colapso, repetição.
trump só foi o rosto mais cínico desse ciclo. a imprensa só foi o coro. o resto do mundo, inclusive quem assiste, comenta, compartilha, se indigna… é parte do mesmo teatro. porque a verdade é simples e brutal, o fim da guerra em gaza nunca aconteceu. o que houve foi uma pausa com maquiagem. o tipo de pausa que o mundo precisa pra se sentir decente antes de continuar ignorando o sofrimento alheio.
no fim, gaza segue como sempre… meio viva, meio morta, um território que o planeta inteiro usa pra testar seus limites morais. e a guerra? a guerra segue, muda de uniforme, muda de tom, mas nunca vai embora. porque a paz, pra quem lucra com o caos, é a pior ameaça de todas.








