
olha, é assim: você entra numa livraria hoje e o que vê? uma parede de papel barato com os títulos de sempre, os hits de instagram, aqueles livros de autoajuda camuflados de literatura séria, e as ficções blockbuster que vêm e vão mais rápido que o café da manhã. é como se o mundo tivesse trocado “a divina comédia” por “os segredos dos milionários que acordam às cinco da manhã” e “crime e castigo” por alguma bobagem de fantasia genérica sobre um vampiro apaixonado. a moda é agora devorar romances banais de youtubers, como se fosse o auge do saber.
e antes que me acusem de saudosista, digo logo: nem todo clássico é intocável ou vai te fazer tremer. tentei ler “moby dick” três vezes. três vezes, meu caro! e tudo o que consegui foi imaginar quantos capítulos mais eu teria de aguentar sobre a bendita baleia. você já tentou encarar “ulisses” de james joyce? eu, uma vez. duas, se contar as páginas que folheei sem entender absolutamente nada, imaginando o que diabo ele estava tentando dizer. e, se estamos sendo honestos, abandonei “em busca do tempo perdido” antes de passar da página 100 – marcel proust com seu desfiar de lembranças como se fosse alguma revelação divina; uma ladainha que só me fez buscar o tempo perdido em algum outro lugar.
e a verdade é que tem muita gente presa em livros que deveriam ter largado há muito tempo, como uma amizade que já foi boa um dia, mas agora só resta um fio de paciência. mas não, insistem, empurram, se amarram nesse masoquismo literário como se fossem ser canonizados por terminar aquele volume interminável de tolstói ou aquelas frases intermináveis de faulkner. o pessoal parece achar que largar um livro é como desistir de um filho, uma ofensa pessoal ao autor, ou – deus nos livre – um sinal de que são “menos leitores”. como se existisse um ranking secreto, uma lista de onde seu nome só vai entrar se você ler até o último ponto final de “os irmãos karamazov”.
mas, sabe, é libertador saber desistir. é como abandonar uma festa chata sem dar explicações, aquela decisão sem culpa, sem remorso. é um talento subestimado, saber largar mão de um livro que só está te torturando. nada de ir até o final só porque um crítico barbudo disse que é a melhor coisa já escrita. se o livro não te pegou, larga. é simples. um livro que não te toca não merece o peso da tua atenção. ler é coisa séria demais pra ser um fardo, e a vida é curta demais pra páginas que você vai esquecer no minuto em que fechar a capa.
então, que se danem os modismos, os clássicos de pedante, e os romances descartáveis. lê-se o que se ama, e o que não faz o sangue ferver, a gente larga. e é assim que se vive, como deve ser.