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2024

telas pra que te quero?

ah, ser pai em pleno século 21 é uma batalha perdida contra o brilho sedutor das telas, e eu escolhi a linha de frente. eu me recusei a seguir o fluxo covarde do “dá o tablet pra ele ficar quieto” e, em vez disso, decidi pelo caminho menos frequentado – aquele onde você realmente cria uma criança. meu filho, aos quatro anos, não é mais um dos pequenos zumbis digitais que vejo por aí, catatônicos, dedos trêmulos e olhos fixos, como moscas atraídas pelo neon do fast food.

e sim, dá trabalho. é infinitamente mais fácil colocar uma tela nas mãos dele e esperar que aquele brilho hipnotizante faça o serviço. a tentação de pacificar a fera com um vídeo qualquer, uma joguinho bobo, é real. eu poderia simplesmente desistir, me render, sentar num restaurante e largar um tablet pra ele enquanto eu finjo viver um momento de paz. mas aí eu não seria pai – eu seria só mais um desses “entregadores de distração” modernos, terceirizando a paternidade pra um pedaço de plástico e vidro.

não, o que eu faço é o contrário. quando estamos no restaurante, eu invento brincadeiras, puxo conversa, pego qualquer coisa na mesa – uma colher, um guardanapo, uma migalha de pão – e transformo em um mundo novo. sou o animador de circo, o contador de histórias, o showman que mantém a coisa interessante. e sabe o que é o mais insano? ele curte. ele entra na brincadeira. porque, no fundo, tudo o que ele quer é o que um monte de pais hoje não está disposto a dar: atenção de verdade. presença real. ele quer eu.

meus contemporâneos? entregaram a guarda dos filhos pro feed do instagram e pros joguinhos que piscam e fazem barulho. vejo aquelas crianças, em fila, todas lado a lado, mas cada uma presa num universo digital. a cena é de uma distopia barata e triste, mas eles nem piscam. ali estão, consumindo as “pílulas de sossego” digitais que deixam os adultos em paz. e é isso que me tira do sério. esses pais querem filhos ou querem um móvel a mais na casa, uma coisa silenciosa e que não incomode?

e eu digo: meu filho vai crescer lembrando que os pais dele estavam ali. ele vai se lembrar que nós não o destruímos com doses cavalares de entretenimento barato e vazios digitais. porque eu sei que, quando você dá uma tela pra uma criança, você está basicamente dizendo “não tenho tempo pra você”. e essa mensagem, cara, eu não tô disposto a passar.

no final, é claro que cansa. é claro que dá trabalho ser o palhaço, o entertainer, o cara que segura a barra enquanto o resto do mundo tá ocupado mandando emojis e vendo séries novas. mas prefiro esse desgaste do que a visão medíocre de um pai acomodado. eu tô aqui pra isso, pra me quebrar, pra me doar e, eventualmente, pra mostrar a ele que o mundo real ainda tem texturas, cheiros e sabores que nenhuma tela consegue simular.

e no fundo? é a melhor coisa que eu já fiz.