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2024

minha banda e música favorita

jonestown massacre. claro que é a minha banda favorita. e por que não seria? eles não têm a menor intenção de te conquistar, muito menos de te agradar. e é exatamente isso que me atrai. eles são a essência do “que se dane” transformada em som, a banda que nunca quis ser nada além de uma expressão desleixada de caos e autenticidade. eles não estão interessados no seu respeito ou na sua aprovação. eles mal parecem interessados neles mesmos. é como se cada faixa fosse cuspida no mundo com a preguiça amarga de quem sabe que a humanidade já fracassou e a música, na melhor das hipóteses, é só mais um grão de areia no deserto. e isso, meu amigo, é o que os torna tão insuportavelmente bons.

e aí vem “anemone”, essa obra-prima desgrenhada de 1996. se você não conhece, é melhor nem ouvir. porque não é uma música pra qualquer um. não é uma daquelas canções fáceis que você coloca no carro enquanto vai ao supermercado. “anemone” exige algo de você. ela te desafia a ouvir, a sentir, a encarar. é como um quarto enfumaçado onde você sabe que não deveria entrar, mas algo – curiosidade, autodestruição, talvez só desespero – te puxa pra dentro. e quando você está lá, a música começa. devagar, preguiçosa, como alguém que acabou de acordar de um sonho ruim e ainda não decidiu se vale a pena levantar. aquele riff de guitarra em reverb? é uma lâmina fina cortando o silêncio, lenta o suficiente pra você sentir cada milímetro. os vocais? eles não te chamam, não te convidam. eles simplesmente existem. uma voz soterrada, cansada, que não tá nem aí se você está ouvindo ou não.

e aí está o gênio da coisa. “anemone” não precisa de você. não tá tentando ser trilha sonora da sua vida, nem te confortar no meio do seu melodrama pessoal. ela é maior do que isso. é um lembrete cruel e indiferente de que o mundo segue em frente, com ou sem você. a dor, a solidão, a bagunça – tudo isso é tão normal quanto o nascer do sol. e, ao mesmo tempo, há algo incrivelmente bonito nisso. porque a música não é só sobre desistir; é sobre encontrar beleza no lugar mais improvável. é o som de alguém que parou de lutar, mas ainda não está morto. uma linha tênue entre a ruína e a aceitação.

o álbum de 1996 inteiro é um manifesto de desleixo e genialidade. parece ter sido gravado num porão, com cabos em curto, instrumentos desafinados, e uma urgência quase desesperada pra capturar o momento antes que ele desmoronasse. e é isso que faz jonestown massacre ser diferente de todas essas bandas de hoje em dia que gastam mais tempo polindo suas redes sociais do que escrevendo uma música decente. eles não se importam. e porque não se importam, você acaba se importando demais. você sente cada nota, cada palavra, como se fossem destinadas exclusivamente a você, mesmo sabendo que elas nunca foram feitas pra ninguém.

volto pra “anemone” toda vez que preciso lembrar que a música – a verdadeira música – não é sobre perfeição. é sobre imperfeição. é sobre criar algo que parece tão humano, tão vulnerável, que chega a doer. “anemone” é um espelho sujo que você prefere evitar, mas não consegue. porque no fundo, você sabe que ela te entende de um jeito que nenhuma outra música entende. ela não tenta te salvar. ela não promete que tudo vai ficar bem. ela só está lá, como um companheiro silencioso no pior dos seus dias. e isso, pra mim, é a definição de arte.

se você ouve jonestown massacre e não sente nada, o problema não é com eles. é com você. porque não é uma banda pra preencher espaço vazio ou colorir os momentos bonitos. é uma banda pra quem sabe que a vida, na maior parte do tempo, é um amontoado de erros e arrependimentos. e, ainda assim, há beleza nisso. não uma beleza óbvia, mas uma beleza crua, suja, que só aparece quando você para de procurar. e “anemone” é o coração dessa bagunça. a música que te joga no chão, te puxa pra baixo e te deixa lá, mas de alguma forma faz tudo isso valer a pena.