
a equação mágica. a mentira mais sedutora do capitalismo moderno: transforme aquilo que você ama em algo que paga as contas. faça da paixão uma profissão. todo mundo já ouviu essa ladainha, seja de um guru motivacional numa palestra insuportável ou daquele colega metido a iluminado que largou o emprego pra “seguir seus sonhos”. e, por um segundo, você até acredita. afinal, por que não? trabalhar com algo que você ama soa como um conto de fadas possível, uma solução simples pra todos os seus problemas. mas, spoiler: isso nunca é simples. e quase nunca é um conto de fadas.
lembro da primeira vez que essa ilusão me bateu. eu tinha uns vinte e poucos, achava que o mundo era meu playground, e que bastava descobrir minha paixão pra resolver minha vida. escrever, talvez? cozinhar? algo criativo. qualquer coisa, desde que não envolvesse terno, reuniões ou aquele cheiro peculiar de café ruim e carpete mofado que todo escritório parece ter. só que ninguém te conta o detalhe crucial: assim que você pega algo que ama e tenta fazer dinheiro com isso, a dinâmica muda. o que antes te dava prazer começa a te cobrar. a sufocar. e, eventualmente, a te consumir.
por exemplo, eu tinha um amigo que adorava desenhar. passava horas rabiscando, criando coisas que ninguém mais conseguia imaginar. todo mundo dizia: “cara, você devia trabalhar com isso”. e ele, ingenuamente, acreditou. virou ilustrador freelancer. no começo, era divertido. ele podia trabalhar em casa, escolher os projetos, até postar no instagram com aquelas legendas insuportáveis tipo living the dream. mas, com o tempo, vieram os clientes. os prazos. os revisions infinitos. “pode deixar isso mais azul?”, “faz uma versão com vibes mais jovens?”, e a clássica: “a gente amou, mas muda tudo”.
não demorou muito pra ele odiar desenhar. não porque perdeu o talento, mas porque o ato de criar deixou de ser dele. era uma transação, uma moeda de troca. cada linha que ele desenhava parecia um pedacinho da alma dele indo embora. “eu queria trabalhar com o que amo”, ele me disse uma vez, com uma cerveja quente na mão e um olhar vazio. “agora eu não amo mais nada.”
e isso não é exclusivo de artistas, claro. cozinheiros, músicos, fotógrafos, escritores – todo mundo que tenta transformar paixão em sustento acaba esbarrando na mesma parede. o mundo não quer sua arte ou sua autenticidade. quer algo vendável. algo rentável. e você se adapta, porque tem que pagar o aluguel. no final, a equação mágica vira uma conta que não fecha.
é isso que ninguém te conta: quando você transforma o que ama em trabalho, aquilo deixa de ser só seu. vira de quem tá pagando. você faz concessões, negocia princípios, e o que sobra não é mais paixão. é apenas mais um dia. a equação mágica é uma armadilha brilhante, mas cruel. porque, no fundo, você nunca deixa de trabalhar. e talvez o segredo não seja fazer o que você ama, mas encontrar algo que você odeie um pouco menos do que o resto.