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2024

deuses

mitologia, essa linda, delirante e completamente insana tentativa da humanidade de explicar sua existência sem ter que recorrer à lógica ou ao bom senso. se a religião organizada é o fast food espiritual da humanidade moderna, então a mitologia é aquele prato excêntrico, supervalorizado e repleto de ingredientes obscuros que algum chef pretensioso apresenta com orgulho, esperando aplausos, enquanto você se pergunta: “que diabos é isso no meu prato?”. mas ainda assim, todos nós devoramos cada pedaço dessa loucura mitológica, não porque faça sentido, mas porque, no fundo, somos eternamente famintos por drama, tragédia, incesto, traição e uma boa dose de caos divino. afinal, quem precisa de reality shows ou novelas quando você tem os gregos, os nórdicos, os egípcios e até mesmo os mesopotâmicos fazendo coisas absolutamente insanas que deixariam qualquer roteirista de hollywood com inveja?

comecemos com os gregos, esses mestres em transformar o mais profundo delírio numa espécie de divina telenovela mexicana, só que com menos bigodes e mais monstros. se você acha que sua família é problemática, experimente ser um deus grego. zeus, o poderoso chefão do olimpo, tinha a moralidade sexual de um astro do rock dos anos 70 misturado com um adolescente no auge da puberdade. ele não respeitava fronteiras: casadas, solteiras, homens, mulheres, ninfas, mortais, animais e, se bobear, até árvores corriam risco quando ele aparecia. com um repertório digno de figurar no livro dos recordes de assédios cósmicos, zeus era um mestre na arte do disfarce para seduzir ou sequestrar, variando de formas sofisticadas como um cisne (o que já é perturbador o suficiente) a outras mais estranhas, como uma chuva dourada. sim, isso mesmo. ouro líquido. os gregos tinham uma imaginação surpreendentemente depravada e criatividade de sobra, sem limites ou censura. hércules, filho desse deus incorrigível, herdou do pai mais do que a força sobre-humana, ganhou também um complexo de inferioridade, uma fúria descontrolada e uma tendência a resolver tudo com violência. sua solução para absolutamente tudo era esmagar, estrangular ou esfaquear, cumprindo seus “12 trabalhos” que, na verdade, eram uma desculpa para sair barbarizando e chamando de heroísmo. em resumo, hércules era o rambo da antiguidade… músculo demais, cérebro de menos, mas sempre com aquela cara de bom moço, escondendo traumas profundos atrás de bíceps gigantes.

e que dizer da mitologia nórdica? se os gregos faziam novelas, os nórdicos produziam filmes de ação blockbuster com orçamento baixo, cheio de explosões, machados, barbas, cerveja e testosterona desenfreada. thor, o glorioso deus do trovão, talvez o mais popular dos vikings celestiais, era um brutamontes adorado por quem achava que resolver problemas com marteladas era algo perfeitamente lógico. ele descia dos céus não pra iluminar a humanidade, mas pra dar porrada em gigantes, beber cerveja, e fazer bobagem atrás de bobagem, normalmente instigado por loki, seu irmão adotivo e deus da confusão generalizada. loki, aliás, é uma das figuras mais interessantes dessa bagunça mitológica, um ser que conseguia ser simultaneamente um herói e um vilão, mais escorregadio que político em ano eleitoral, e dono de uma mente tão retorcida que faria maquiavel parecer inocente. ele inventava problemas, dava golpes em seus familiares divinos, e ainda tinha a audácia de se surpreender quando alguém ficava irritado. odin, o chefe dessa gangue celeste, era um deus de poucas palavras e muitas obsessões. em busca de sabedoria, pendurou-se em uma árvore por nove dias, sacrificou um olho, e fez coisas que deixariam qualquer terapeuta apavorado. mas quem precisa de terapia quando você pode simplesmente morrer heroicamente em batalha e ressuscitar pra fazer tudo de novo na festa infinita de valhalla? a filosofia nórdica era clara, viva rápido, morra jovem, e deixe um cadáver espetacular, de preferência num barco em chamas.

e os egípcios, então? ah, essa gente entendia o poder da burocracia divina! com uma mitologia organizada como uma repartição pública, cheia de deuses com cabeças de animais exóticos, os egípcios tinham a capacidade de transformar o além-vida num eterno tribunal kafkiano. imaginem só… depois de morrer, você é julgado por um deus com cabeça de chacal, seu coração é colocado numa balança contra uma pena, e, dependendo do resultado, você pode passar a eternidade num paraíso de luxo ou simplesmente ser devorado por um monstro com cabeça de crocodilo e traseiro de hipopótamo. não sei vocês, mas me parece uma aposta injusta pra quem passou a vida inteira no calor escaldante construindo pirâmides para faraós egocêntricos. rá, o poderoso deus-sol, navegava pelo céu durante o dia e pela noite atravessava o submundo numa espécie de barquinho celestial. mas a verdadeira lição egípcia é que a vida após a morte depende de duas coisas… quão bem você foi embalsamado e quantas riquezas você levou pro túmulo. capitalismo espiritual, minha gente. ou seja, os egípcios já sabiam que até o além-vida era reservado pros ricos e influentes.

no fim das contas, mitologia não passa de um espelho grotesco que reflete nossas obsessões, nossos medos mais profundos, e nossos desejos mais obscuros. é a humanidade jogando todos seus traumas num caldeirão e criando deuses disfuncionais que fazem coisas tão escandalosas que nossa vida moderna e caótica parece, em comparação, quase entediante. então, talvez devêssemos agradecer aos antigos por essa coleção interminável de contos fantásticos, que provam, acima de tudo, que a humanidade sempre foi e sempre será maravilhosamente louca, delirante e incrivelmente criativa em sua busca por explicações absurdas para uma existência ainda mais absurda.
afinal, como dizia o velho nietzsche, “no final, somos todos mitos que acreditam em mitos.” e que assim seja.