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2025

smartwatch

descobri uma coisa que, se eu falasse numa mesa de bar, iam rir da minha cara. mas aqui vai, a melhor forma de fazer detox do celular é… usar um smartwatch com plano de celular. sim, parece papo de maluco, tipo aqueles caras que pregam jejum de suco verde ou que acreditam em terapia de cristal, mas segura a onda… faz sentido.

o celular sempre esteve ali, grudado em mim, como uma verruga brilhante que eu não conseguia arrancar. e, claro, eu justificava…“é pro trabalho”, “preciso estar disponível”, “e se der alguma merda?”. mas a verdade era mais suja… eu era só mais um viciado, cutucando a tela como quem coça uma ferida que nunca cicatriza. e-mails que não importam, notificações que não dizem nada, feeds intermináveis que me faziam sentir vivo por uns segundos e vazio pelo resto do dia. era como encher a cara de fast-food, satisfatório no momento, nauseante logo depois.

então eu fiz a coisa mais improvável que poderia imaginar, troquei meu retângulo brilhante por um relógio idiota no pulso. sim, um smartwatch. e não só isso, com plano de celular. como se eu tivesse dado um tapa na cara do meu eu de dez anos atrás e dito… “parabéns, campeão, você chegou ao ponto em que precisa de uma tela do tamanho de um selo postal pra não se destruir”. e, de forma absurda, funcionou.

porque o relógio não foi projetado pra ser confortável. é um exercício de tortura disfarçado de gadget. digitar nele é um pesadelo medieval, cada letra uma punição. ver vídeo? impossível. perder meia hora rolando feed? só se você tiver a paciência de um monge e a visão de uma águia. o que sobra é só o essencial. e de repente eu percebi que talvez o essencial fosse tudo o que eu precisava. atender uma ligação, mandar um “chego em dez”, pedir um uber. só isso. e isso era suficiente.

o que mais me surpreendeu não foi a praticidade. foi o silêncio. a ausência daquele zumbido constante de notificações inúteis que me faziam acreditar que o mundo inteiro precisava da minha atenção. e sem o celular, eu comecei a reparar em coisas que antes eram só pano de fundo. o cara fritando pastel na esquina. até o som idiota do metrô parecia mais nítido. era como se a vida tivesse saído do modo silencioso.

mas não se engane, não virei iluminado. não comecei a meditar, nem a postar frases motivacionais com fotos de cachoeira. continuo sendo eu, cínico, desconfiado, com uma tolerância baixa pra qualquer bullshit espiritual. a diferença é que agora, quando sinto vontade de me anestesiar com rolagem infinita, meu pulso me lembra que não vale a pena. e eu fico ali, com a inquietação crua, que é desconfortável, mas real.

foi aí que caiu a ficha… o detox não é sobre pureza, é sobre limite. é aceitar que eu não sou forte o suficiente pra largar a droga de vez, mas posso viver com uma dose homeopática sem me perder no abismo. o smartwatch virou a minha metadona digital, uma forma estranha, meio patética, mas eficaz de não sucumbir.

no fim, eu acho até engraçado. eu, que sempre achei ridículo esse papo de “tecnologia consciente”, descobri que o único jeito de me salvar foi enfiar a cara numa versão piorada dela. como se pra me libertar do vício eu precisasse de um objeto ainda mais limitado, mais frustrante, mais ridículo. e talvez seja isso mesmo… às vezes a liberdade não vem com asas, vem com uma coleira curta.

e confesso, gostei da coleira. porque, pela primeira vez em muito tempo, não sou eu quem corre atrás da tela. é ela que fica ali, pequena, contida, me lembrando que o mundo é grande demais pra caber num display de cinco polegadas.