
quando vejo uma beleza perfeita, sempre me pergunto o que há por trás. porque perfeição demais é como um soco em câmera lenta: previsível, sem impacto real, e totalmente planejado pra te distrair do que importa. você olha, admira, mas algo no fundo da sua mente grita, esperneia, avisa que aquilo é só uma camada – uma capa de revista, uma cidadezinha turística que só existe em dias ensolarados, mas que desmorona no primeiro sinal de chuva. perfeito demais pra ser verdadeiro, saca? é o tipo de coisa feita pra turista deslumbrado. e turista, a gente sabe, só vê o que quer ver.
pensa em uma praia de areia branca, água cristalina, coqueiros que parecem plantados ali pela disney. uma beleza tão impecável que quase ofende. mas você vira a esquina, sai do campo de visão do resort, e o que encontra? montanhas de plástico, vendedores exaustos, a sujeira varrida pra debaixo do tapete. a beleza controlada ao milímetro, que só se mantém intacta enquanto você olha de longe. só que chega mais perto e vê que aquilo é pura maquiagem. uma beleza que nunca foi pensada pra durar, só pra impressionar o olhar rápido e raso de quem tá ali pra se maravilhar e seguir adiante.
e isso vale pra tudo: lugares, pratos, pessoas, ideologias, até aquela maldita “experiência cultural” vendida em pacotinho de luxo pra gringo experimentar um pouquinho da “realidade”. o que é perfeito demais, polido demais, foi feito pra te enganar. feito pra te manter entretido, satisfeito e, principalmente, longe do caos e da sujeira que realmente alimentam a vida. porque, meu amigo, beleza de verdade é suja, é confusa, é desconfortável. ela não se dobra pra você, não se deixa engaiolar numa vitrine de souvenir. beleza real, aquela que fica contigo, tem manchas, tem rachaduras, tem gosto de suor e cheiro de rua depois da chuva.
perfeição é pra quem não quer confronto, não quer desafio, só uma distração. é pra quem acha que a vida é um feed de instagram, uma sequência de frames sem bagunça, sem erro, sem falha. só que a verdade nunca está ali, na superfície. tá no cheiro de cozinha depois do expediente, no bar sujo onde ninguém faz questão de te agradar, no lugar em que os moradores nem fingem sorrir pro seu dinheiro. quer ver beleza? beleza de verdade? então aceita o caos, a assimetria, o desgaste, as cicatrizes que carregam histórias reais, não só o verniz que esconde o que ninguém quer ver.
essa beleza ensaiada, controlada, embalada em celofane, só serve pra uma coisa: te manter longe do que é vivo, pulsante, brutalmente autêntico. então, sim, quando vejo algo perfeito demais, o que eu sinto não é encantamento – é desconfiança. porque o que é genuíno, o que realmente importa, não vem em embalagem brilhante, não posa pra fotos. e, no fundo, talvez o que a gente teme não é que essa beleza seja falsa. mas que, ao olhar de perto demais, ela revele o quanto a gente mesmo se acostumou a viver no raso.