
o segredo da vida, se é que você quer ouvir isso de mim, um mestre em desperdiçar tempo, é simples: desperdiçar tempo com as coisas e pessoas que você gosta. parece óbvio, né? mas a ironia é que a maioria de nós passa a vida inteira ocupada demais para perceber isso. correndo atrás de coisas que não importam, fingindo que somos importantes, tentando impressionar gente que nem lembrará nosso nome no dia seguinte. e quando finalmente percebemos, já estamos com um pé na cova ou, pior, na fila do café discutindo com um adolescente sobre o porquê o latte não saiu com a quantidade certa de espuma.
eu aprendi essa lição do jeito difícil, como todo idiota aprende as coisas. teve uma época em que eu achava que a vida era sobre conquistas: títulos, dinheiro, aquela promoção que te dá um cargo ridículo e uma sala com porta de vidro. eu achava que o objetivo era ser admirado, temido, ou pelo menos ouvido em reuniões intermináveis onde ninguém realmente dá a mínima pro que você diz. então, lá estava eu, perdendo minha juventude em cubículos com cheiro de carpete velho e café requentado, fingindo que amava a vida corporativa. porque, sabe como é, alguém te disse que aquilo era “o caminho”.
e foi aí que aconteceu: um dia, na pausa para o almoço, eu decidi ignorar os sorrisos falsos e as conversas sobre o último episódio de alguma série idiota e fui para o parque. comprei um livro barato de um sebo, sentei num banco qualquer e passei a tarde inteira lendo. uma tarde inteira. sem emails, sem telefonemas, sem “vamos alinhar as expectativas”. e quer saber? foi a melhor coisa que eu fiz em anos. foi um desperdício glorioso de tempo. ninguém morreu porque eu não estava em uma reunião, ninguém se importou que minha planilha não ficou pronta naquele dia. mas eu… ah, eu me senti vivo.
foi aí que percebi que talvez a vida seja mesmo sobre esses momentos estúpidos e aparentemente inúteis. aquele tempo que você gasta jogado no sofá assistindo filmes ruins. as tardes que você passa conversando com amigos sobre nada em particular, talvez bêbado, talvez não. as noites que você sai para dançar até as pernas doerem, mesmo sabendo que vai se arrepender quando o despertador tocar. essas coisas que o mundo quer te convencer que são um desperdício. porque, no fundo, são. e é exatamente por isso que elas valem tanto.
mas não pense que essa epifania veio sem uma dose generosa de culpa. porque nós fomos programados, treinados como cães de Pavlov, a acreditar que todo segundo da nossa existência precisa ser produtivo, eficiente, rentável. e eu caí nessa armadilha por anos, desperdiçando minha vida ao tentar não desperdiçá-la. é cruel, não é? mas a verdade é que o verdadeiro desperdício é não desperdiçar tempo. é passar tanto tempo correndo atrás de coisas que você nem gosta que acaba esquecendo de viver.
então agora eu faço questão de desperdiçar meu tempo com maestria. porque, veja bem, é aí que está o segredo: não é sobre ser improdutivo, é sobre ser intencionalmente improdutivo. é sobre dizer “foda-se” para o mundo e fazer algo que só você entende. algo que te faz sorrir como um idiota. algo que, no grande esquema das coisas, não importa. mas importa pra você. e, no final das contas, isso é tudo que importa.
e antes que você me pergunte, não, não existe uma planilha ou um manual para isso. ninguém vai aparecer com um tutorial no youtube te ensinando como ser um bom desperdiçador de tempo. e é melhor assim, porque a última coisa que precisamos é de algum coach de produtividade tentando transformar a arte de não fazer nada em uma startup. “como procrastinar de maneira eficiente”, “10 passos para ser mais relaxado sem perder o foco”. me poupe. o segredo é justamente cagar solenemente para qualquer coisa que se pareça com metas, resultados ou, deus me livre, otimização.
porque, veja, o grande erro da humanidade foi essa ideia de que a vida precisa de propósito. propósito é um conceito que inventaram pra te manter na linha, te obrigar a acordar cedo e ser funcional. e, ok, talvez funcione pra um punhado de pessoas que amam falar sobre missão de vida e fazem listas de gratidão, mas pra nós, o resto dos mortais, propósito é só outra palavra pra “desculpa esfarrapada”. “ah, eu trabalho 12 horas por dia porque meu propósito é criar um futuro melhor.” mentira. você trabalha 12 horas por dia porque tem medo de não pagar o aluguel e acabar dividindo o banco de uma praça com um pombo alcoólatra. o resto é narrativa pra te ajudar a dormir.
eu, pelo menos, me cansei de fingir. cheguei num ponto em que percebi que o único propósito que vale alguma coisa é não ser miserável. e não ser miserável significa, na maior parte das vezes, se dar permissão pra ser um pouco idiota. pra fazer o que você quiser, sem culpa, sem justificativa, sem essa necessidade neurótica de provar que você está “aproveitando a vida ao máximo”. sério, que obsessão é essa com aproveitar a vida? o que isso sequer significa?
mas claro, tem sempre aquele amigo, aquela pessoa insuportavelmente positiva, que aparece pra te lembrar que “desperdiçar tempo é relativo”. que “não é desperdício se faz bem pra você”. não, querido. eu não preciso dessa permissão disfarçada de frase motivacional. eu sei que desperdiço tempo e faço isso com orgulho. o ponto não é se faz bem ou não. o ponto é que eu quero fazer isso porque sim. porque eu posso. porque a vida já é curta e sufocante o suficiente sem a pressão de fazer algo significativo o tempo inteiro.
então, vou te dizer o que eu faço quando quero realmente saborear o vazio da existência: eu ignoro o relógio, desligo o celular e faço algo tão ridiculamente insignificante que seria motivo de piada em qualquer círculo social respeitável. tipo assistir reprises de um reality show ruim. ou caminhar sem rumo só pra ver onde acabo. ou, melhor ainda, sentar em algum lugar movimentado e inventar histórias absurdas sobre as pessoas que passam. aquele cara de terno ali? ele tem um fetiche estranho por bonecas de porcelana. a mulher com o cachorro? com certeza está planejando um crime. isso não me traz dinheiro, não me traz fama, não me traz absolutamente nada. mas me traz prazer. e, na real, prazer já é mais do que a maioria das pessoas consegue admitir que tem.
então, qual é o segredo da vida? é não dar a mínima pra segredos, fórmulas ou grandes ideias. é perceber que o grande truque é este: estamos todos apenas tentando encontrar maneiras de passar o tempo até que ele acabe. então, faça isso do jeito mais divertido, idiota e pessoal que conseguir. porque, meu caro, se o mundo está queimando de qualquer jeito, você pode muito bem assar uns marshmallows no fogo e aproveitar a vista.