
eu já devia saber. devia ter aprendido com os erros dos outros, com os olhares vazios dos que tentaram antes de mim, com os sorrisos amarelos daqueles que ainda insistem. mas não. fui teimoso. me joguei na ilusão do empreendedorismo como quem mergulha de cabeça numa piscina vazia, achando que lá no fundo encontraria um baú cheio de dinheiro, status e liberdade. o que encontrei foi a dura realidade: empreender e ter dinheiro são coisas que não combinam. são como óleo e água, como dietas veganas e churrascarias, como finais felizes e histórias de verdade.
o problema começa logo no início, quando a gente ainda é ingênuo o suficiente pra acreditar naquela conversa fiada de “faça o que ama e nunca mais terá que trabalhar um dia na vida”. mentira. faça o que ama e prepare-se pra trabalhar o triplo, dormir menos, engordar ou emagrecer por puro estresse, e ainda sorrir como um idiota enquanto diz “tá indo bem, sim, graças a deus” pra amigos que, no fundo, já apostam quando você vai desistir.
e o dinheiro? ah, o dinheiro. esse desgraçado que deveria estar fluindo em minha direção como um rio caudaloso, mas que, na realidade, pinga como torneira quebrada, sempre quando menos espero, sempre insuficiente. os boletos chegam, os impostos devoram qualquer resquício de esperança, e os clientes? os clientes acham que o preço é caro demais, que dá pra fazer um descontinho, que “poxa, fulano faz mais barato”.
a verdade é que ser empreendedor não é sobre ser dono do próprio negócio, é sobre ser escravo do próprio sonho. porque a ideia de liberdade que vendem é tão falsa quanto comida de avião. você não é livre. você trabalha em dobro, responde mensagens às três da manhã, negocia com fornecedores que parecem vilões de filme b e, quando sobra tempo, ainda precisa fingir que está tudo sob controle.
e nem vamos falar de férias. férias são uma miragem no deserto corporativo. quando você trabalha pros outros, pelo menos tem a dignidade de um décimo terceiro, um feriado aqui e ali, um final de semana sem culpa. quando você empreende, cada dia longe do negócio significa perder dinheiro. significa voltar e descobrir que seu cliente está querendo encerrar o contrato só pelo motivo de você não ter participado de duas reuniões.
o pior é que, mesmo sabendo de tudo isso, a gente segue em frente. por quê? porque somos teimosos, iludidos, vítimas do capitalismo afetivo que nos faz acreditar que, se trabalharmos duro o suficiente, uma hora a recompensa vem. e aí, depois de anos de esforço, de noites sem dormir, de almoços pulados e cabelos arrancados, talvez, e só talvez, você consiga pagar todas as contas sem precisar vender um rim no mercado negro.
mas o jogo nunca é justo. o pequeno empreendedor compete com gigantes, com algoritmos cruéis, com burocracias que só favorecem quem já tem dinheiro. é davi contra golias, mas sem a pedra. e aí você percebe que o mundo dos negócios não é sobre trabalho duro, mas sobre influência, sobre quem você conhece, sobre quem te deve favores. mérito? esquece. se mérito fizesse diferença, professor ganharia mais que ceo de banco.
e se você ousar crescer um pouquinho, não se engane: o governo, os bancos, os concorrentes, todos vão dar um jeito de te lembrar quem manda. vão te enterrar em taxas, te sufocar em exigências, te lembrar que, no fundo, você nunca foi livre. o empreendedor médio não tem tempo nem de olhar pra cima e perceber que está preso numa gaiola dourada, só que sem o dourado.
no final, empreender é um ato de fé. é acreditar no improvável, é insistir no impossível, é se apaixonar por um sonho que só você vê. e, como toda paixão cega, é perigoso. você pode até ter um vislumbre do sucesso, mas a um custo alto demais. o dinheiro? ah, o dinheiro segue fugindo, escorregando pelos dedos como areia fina. mas pelo menos, dizem, você é seu próprio chefe. só falta conseguir pagar um salário decente pra si mesmo.