
quando, por alguma falha na matrix, acabo indo a uma festa, faço o que qualquer pessoa minimamente sensata faria… entro, avalio a cena como um antropólogo num experimento social e traço uma estratégia de sobrevivência. porque festas, sejamos honestos, não são lugares para se divertir, são arenas de performance, teatros improvisados onde todo mundo está tentando parecer um pouco mais feliz, mais interessante, mais bem-sucedido do que realmente é.
então eu observo. escolho um canto estratégico, onde possa ter uma visão panorâmica do circo sem ser puxado para dentro dele. vejo os primeiros movimentos… os que chegam radiantes, como se tivessem ensaiado esse momento no espelho, os que entram inseguros, esperando encontrar um rosto conhecido para ancorar sua existência, os que já começam a beber como se cada gole fosse um salvo-conduto para suportar a noite.
evito as rodinhas de risadas ensaiadas e conversas pré-fabricadas. aquele papo de “e aí, no que você anda trabalhando?”, seguido de um monólogo sobre algum projeto irrelevante que a pessoa claramente não se importa, mas precisa vender como o próximo grande acontecimento da humanidade. evito também os palestrinhas, os especialistas relâmpago que, em um mês, passaram da obsessão por vinho natural para um doutorado improvisado em inteligência artificial. e evito, principalmente, qualquer conversa que envolva a frase “vamos marcar algo”… porque sabemos que não vai acontecer.
se há comida, provo. não pelo evento, mas pela ciência. um canapé decente pode redimir uma noite inteira de interações desnecessárias, e um prato malfeito pode selar meu destino, permanência mínima, fuga rápida. observo as bandejas passando, os olhares famintos de quem finge estar ali pelo networking, mas secretamente está só esperando o momento certo para atacar o bufê.
a música, claro, é sempre um fator determinante. se for alta demais, a festa se transforma num jogo de mímicas constrangedor. se for ruim demais, todo mundo finge gostar para não parecer “desatualizado”. e se houver pista de dança, invariavelmente chega aquele momento da noite em que alguém, bêbado de autoconfiança ou tequila, tenta arrastar alguém para o meio dela.
fico o tempo necessário para cumprir minha cota social, garantir que minha presença foi notada e, principalmente, para sair no momento exato, nem cedo demais, para não parecer antissocial, nem tarde demais, para não ser sugado para o vórtex de promessas de amizade eterna que evaporam na manhã seguinte. e quando finalmente atravesso a porta de volta para minha própria realidade, longe de luzes artificiais e conversas vazias, respiro fundo e sorrio. porque no fim, a melhor parte de qualquer festa sempre será sair dela.