
olha, eu não tô interessado em participar desse desfile de consumo coreografado onde cada objeto precisa ter um logo visível, um QR code e a aprovação silenciosa de meia dúzia de influenciadores que nunca sujaram a roupa fora de um set. pode ficar tranquilo. eu passo. o que eu uso, o que eu escolho carregar comigo, não foi feito pra agradar. foi feito pra durar. e mais do que isso… foi feito com a audácia quase herética de permitir conserto. sim. conserto. aquela coisa jurássica que exige paciência, habilidade e um certo nível de respeito pela existência material das coisas.
é isso que separa o lixo com brilho do que realmente importa. porque qualquer coisa pode ser feita pra durar até o próximo lançamento. agora, ser feito pra durar e ainda por cima merecer ser consertado? isso é outra conversa. isso é uma declaração de princípios. é como dizer: “eu não tô aqui pra te impressionar, eu tô aqui pra te acompanhar enquanto o mundo desaba em volta.”
cada peça que eu tenho foi feita por alguém que entendeu o valor do tempo. alguém que não tava tentando ganhar curtidas ou entrar no radar de tendência. gente que trabalha com silêncio, com precisão. gente que não tem pressa porque sabe que apressado só faz plástico. e plástico, por mais que reluza, morre jovem e sem história.
é por isso que eu uso botas que parecem ter sobrevivido a três revoluções e um inverno em stalingrado. casacos que pesam como promessas sérias. ferramentas que não piscam, não falam com o celular, mas funcionam. sempre. porque foram feitas por mãos que conhecem erro, conhecem acerto e conhecem a diferença brutal entre design e ilusão.
e quando uma costura abre, um zíper emperra, uma peça quebra… ótimo. sinal de que viveu. sinal de que tem história. sinal de que é gente grande o suficiente pra não pedir desculpa. e aí vem a parte bonita… você manda consertar. não por nostalgia. mas porque vale. vale o esforço. vale o tempo. vale o sapateiro, o costureiro, o torneiro, o velho da oficina que sabe mais sobre matéria do que qualquer ceo sabe sobre propósito.
as minhas coisas não têm pressa. não têm pose. não pedem desculpa por não serem bonitas no padrão da revista. mas elas aguentam. resistem. voltam. e quando eu olho pra elas, vejo tudo o que não cabe na lógica atual… o imperfeito que melhora, o velho que ganha valor, o gasto que ensina. coisas que, em vez de se desfazerem com o tempo, ganham tempo.
então sim, pode ficar com seus tênis de lançamento, seus gadgets de plástico reciclado, suas roupas feitas pra durar três lavagens e uma crise de estilo. eu fico com o que me acompanha em silêncio, cheio de marcas, cheirando a couro, óleo e teimosia. porque elegância de verdade não grita. ela permanece. mesmo remendada. e ainda assim, mais inteira do que muita coisa que saiu da loja ontem.