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2025

só um minutinho

esse pessoal de colete laranja ou marrom são tipo pop-up de internet nos anos 2000. lembra? você tá de boas, lendo uma coisa qualquer, e do nada aparecia uma janela piscando… “você foi o milionésimo visitante! clique aqui!”. pronto. eles são isso, só que em versão ambulante, suada, com crachá e um sorriso que parece que foi instalado na cara deles à força, tipo software pirata.

e tem toda a encenação, a abordagem é sempre uma tentativa de stand-up falido. “oi, você gosta de sorrir?”, “ei, tem um minutinho pra mudar o mundo?”, ou o clássico “você se importa com crianças?”. parece piada, mas não é. é marketing com o uniforme do bem. é fast-food da solidariedade… barato, rápido, automático e servido em débito recorrente. você não adota uma causa, você assina um plano. como se fosse netflix, mas sem série boa.

e o ridículo é que eles se fantasiam de heróis de rua. colete, prancheta, crachá balançando. parecem recrutas de um exército do bem, só que em vez de salvar a galáxia, estão tentando arrancar o número do seu cartão de crédito na porta do shopping. distopia urbana não é cyberpunk com neon e samurais digitais. é fila de semáforos humanos vendendo consciência social na calçada.

e todo mundo que passa por eles já tem a resposta pronta, como se fosse um mantra automático. “tô com pressa”. é quase um reflexo, como puxar a mão quando encosta no fogo. e eu juro, é engraçado, porque a maioria dessas pessoas não tem pressa de nada. tão indo pro café, pro rolê, pro nada. mas soltam esse “tô com pressa” com a seriedade de quem acabou de ser chamado pra uma reunião urgente na onu.

eu, sinceramente, não consigo usar esse “tô com pressa”. eu não sou bom nisso. eu acabo soltando outra coisa, mais no improviso. tipo… “olha, irmão, minha pressa é de chegar em casa e tentar lembrar onde deixei minha dignidade. se eu achar, eu te aviso e talvez a gente conversa.”
ou então… “cara, se eu parar agora, vou perder o capítulo da novela da minha vida, que é eu tentando atravessar essa rua sem ser sugado por débito automático. spoiler: eu nunca consigo.”
às vezes até mando um mais simpático… “ó, eu até ajudava, mas no momento minha maior ong é a padaria da esquina, porque se eu não pagar fiado hoje, amanhã não tem pão.”

não é que eu seja contra as baleias, as crianças ou as florestas. longe disso. só que a rua não é um telemarketing a céu aberto. eu não quero negociar minha culpa social entre uma esquina e outra. eu quero andar, ouvir música, pensar na vida, sem precisar rejeitar a cada três metros alguém vestido de semáforo ambulante.

porque a verdade é essa, ajudar o mundo não deveria parecer tanto com um vendedor de plano de internet me perseguindo no meio da calçada. mas parece. e todo santo dia a rua vira call center, com script, meta, kpi, sorriso ensaiado. e você ali, fingindo que tá atendendo um telefonema imaginário só pra escapar da sabatina moral.

eles querem que eu compre um passe mensal pra aliviar a culpa existencial. eu só quero atravessar a rua em paz.