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2025

gpt

olha, não é só a praga do gpt, é a praga da terceirização da própria alma. antes, escrever era um ato quase indecente… você expunha suas feridas, botava o dedo no próprio umbigo e depois enfiava a mão na ferida do leitor. hoje? hoje escrever virou um serviço de buffet: “me manda um briefing e eu te entrego algo neutro, rápido, sem colesterol emocional”. é como se a humanidade tivesse descoberto uma forma de vomitar palavras sem nunca ter mastigado um pensamento.

e não me venha com aquele papo de “ah, mas é só uma ferramenta”. ferramenta, o cacete. um martelo é uma ferramenta. uma faca é uma ferramenta. gpt não é martelo, é o cozinheiro inteiro fazendo seu mise en place, cozinhando, montando o prato, servindo e ainda limpando a cozinha enquanto você fica no canto, mexendo no celular. no fim, o prato é bom, mas não tem seu suor, não tem seu erro, não tem seu tempero. e, pior, você começa a achar que nunca soube cozinhar de verdade.

a indústria adorou. claro que adorou. nunca foi tão fácil encher o mundo de conteúdo. e “conteúdo” virou exatamente isso… uma massa homogênea de frases que cabem em qualquer marca, qualquer post, qualquer legenda. e se você acha que tá sendo original usando gpt, te digo… você é só mais uma peça nessa fábrica de linguiça linguística onde cada salsicha tem o mesmo sabor genérico.

antigamente, as pessoas liam pra sentir alguém. hoje, leem pra confirmar que nada vai incomodar, que tudo vai ser mastigado e servido num tom neutro, sem arestas, sem verdade demais. gpt é perfeito pra isso, um sommelier de irrelevância.

e sabe o mais triste? não é que as pessoas não saibam mais escrever. é que elas não querem mais passar pelo desconforto de pensar. escrever exige lidar com silêncios, com o feio, com aquela frase que não sai. mas agora, quando o branco da página aparece, você corre pra pedir ajuda ao robô, como quem chama um entregador porque esqueceu como se frita um ovo. e assim, pouco a pouco, você para de cozinhar e começa a viver de comida pronta.

daqui a pouco, nem vai ser mais “escrever com gpt”. vai ser só “escrever” e pronto, porque a palavra vai perder o peso de ser um ato humano. e aí, meu amigo, o que sobra? a gente, sentado num banquinho, assistindo uma máquina contar as histórias que a gente nunca teve coragem de viver.

porque, no fim das contas, o gpt pode até escrever por você. mas ele não pode beber no seu bar sujo preferido, nem brigar com seu amigo… e são essas coisas que valem a pena contar. o resto é só mais um post bonito pra ninguém lembrar amanhã.

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2025

dexter

rever dexter é revisitar um crime já resolvido. o veredito já foi dado, as provas já foram apresentadas, todo mundo sabe quem matou e, mesmo assim, você volta pra cena. não pela revelação, mas pra olhar de perto as marcas na parede, os detalhes que ninguém percebeu na primeira perícia. é caminhar de novo por um lugar onde o sangue já secou, mas o cheiro ainda está lá.

a primeira vez é corrida. você segue o fio da trama, se perde na tensão do “quem?”, “quando?”, “como?”. na segunda, a pressa morre. sobra a frieza de examinar cada peça. é aí que aparecem as coisas que estavam escondidas à vista de todos… o figurante que olha um segundo a mais pra câmera, a pausa estratégica num diálogo aparentemente banal, o som abafado que prenuncia o desastre antes que ele chegue.

miami deixa de ser o fundo bonito. agora, ela é personagem suado, barulhento, falsamente iluminado. os prédios coloridos são maquiagem barata, o calor é tão espesso que parece pesar sobre as cenas, e cada rua tem o tipo de barulho que serve mais pra distrair do que pra acolher. é a cidade perfeita para que tudo aconteça sem alarde. não precisa esconder nada quando todo mundo finge que não vê.

os coadjuvantes ganham outro peso na releitura. não são apenas peças para mover a narrativa… são sinais. cada gesto, cada fala fora de hora, cada sorriso mal colocado é pista. a primeira vez, isso se perde no fluxo. na segunda, cada aparição vira marcação de território. a trama não é mais um suspense, é um mapa de evidências que você percorre sabendo exatamente onde vai dar.

e a violência… ela muda. perde o choque fácil, aquele que depende do elemento surpresa, e revela o que sempre esteve lá… método. as mortes deixam de ser apenas ação e se tornam assinatura. não é sobre o ato, é sobre a execução. posição, tempo, controle absoluto. não existe desperdício, não existe acidente e é impossível não notar a beleza técnica na frieza disso.

o maior impacto de rever está no fato de que não há inocência. não há desculpa. o que choca agora não é o que acontece, mas o quanto tudo é perfeitamente orquestrado. e quando o episódio termina, não há “reviravolta” para comentar. há a constatação de que cada movimento, cada fala e cada ausência de som já estava no lugar desde o início.

assistir pela segunda vez é como abrir um corpo já autopsiado e, mesmo assim, encontrar mais para examinar. é lento, é detalhado, e deixa claro que dexter nunca foi apenas sobre matar foi sempre sobre construir algo que funcionasse como uma máquina: silenciosa, precisa, e implacável.

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2025

abc

vamos direto ao que interessa.
esse filme… esse filme não é só bom.
esse filme é necessário.

e não no sentido chato, acadêmico, de “ah, é um clássico do cinema americano”. não, porra. glengarry glen ross é necessário porque ele fala a verdade que ninguém quer ouvir, muito menos os palhaços que ganham dinheiro te dizendo que tudo é mindset e que você só precisa acreditar mais em si mesmo pra transformar a sua realidade.

esse filme cospe na cara do otimismo institucional.
ele te arranca da tua zona de conforto com a delicadeza de uma marreta enferrujada.
ele desmembra, humilha, expõe e te obriga a encarar aquilo que todo mundo sabe, mas ninguém tem coragem de dizer…
o mundo do trabalho é um campo de batalha e você já perdeu. só ainda não percebeu.

dirigido por james foley e baseado na peça de david mamet, o poeta da frustração, o shakespeare dos desgraçados, glengarry glen ross é um tour de force sobre pessoas à beira do colapso, sobre o capitalismo nu e cru, sem decência, sem piedade, sem botão de “desconectar”. aqui, o sucesso é a única religião. e fracassar é mais do que uma vergonha, é uma sentença de morte profissional, emocional, existencial.

a história é simples. quase banal.
um escritório de vendas de imóveis, onde os corretores têm que vender lotes completamente irrelevantes para clientes desavisados.
a direção da empresa resolve fazer um jogo sádico… quem vender mais, ganha um carro. o segundo lugar, uma faquinha de churrasco. o resto?
é rua.

e no meio disso, os vendedores. pessoas que não acreditam mais no que estão vendendo.
alguns que nunca acreditaram.
outros que ainda fingem.
todos eles, quebrados por dentro.
cada um mais desesperado que o outro, arrastando seus ternos como soldados mutilados depois de uma batalha que ninguém ganhou.

e aí, entra a aula de atuação mais pornograficamente poderosa já filmada.
alec baldwin, com uma única cena, entra como uma entidade do inferno corporativo e redefine o que é domínio.
ele aparece feito uma tempestade de arrogância e desdém, vomitando verdades com a calma de um assassino serial motivacional…
“coffee is for closers.”
essa frase virou mantra porque é real.
no mundo real, o café… a dignidade, o respeito, o direito de existir… é só pra quem entrega resultado.
não importa como.
não importa o preço.
você não vendeu? então cale a boca.
só isso.

no meio do veneno escorrendo da boca do baldwin, nasce o bordão que virou religião, tatuagem, adesivo, slogan, discurso de gerente em evento de final de ano, ABC Always Be Closing.
uma filosofia tão brutal quanto verdadeira.
um mantra assassino que resume a lógica perversa da performance constante.
não existe “fazer o seu melhor”, não existe “dar o sangue”, não existe “processo de aprendizado”.
o que existe é fechou ou não fechou?
essa é a pergunta.
a única que importa.
e se você não tem resposta, então você é só mais um encosto na planilha.

“always be closing” virou tatuagem de vendedor, virou print em slide de palestra de gente que nunca vendeu nada além da própria ilusão.
mas ali, naquele momento, naquela cena, naquele filme, ABC…
é uma sentença.
é um soco na boca de todo funcionário que acha que um “bom esforço” merece parabéns.
não merece.
não vale nada.
não importa o quanto você tentou.
o mundo não dá medalha por tentativa.
o mundo dá demissão, dívida e gastrite.
e se você não entendeu isso… então assiste de novo.
porque o alec baldwin entendeu.
o mamet entendeu.
o filme inteiro é uma carta aberta à verdade que os coaches, os rhs, os donos de startup e os ceos que se vestem como estagiário fingem não saber…
ou você fecha, ou você tá morto.

e ninguém vai chorar no teu velório.
porque nem vão te notar.

al pacino interpreta ricky roma, o lobo vestido de lobo. um manipulador carismático, brilhante, um predador social com voz suave e discurso afiado. o cara que te convence a comprar um terreno em marte com sorriso nos lábios e desprezo nos olhos.
ele não vende. ele seduz.
e você compra… porque você quer acreditar.

jack lemmon, o velho leão ferido. o símbolo do passado engolido pelo presente. patético, trágico, desesperado. ele tenta, e tenta, e tenta… mas o mundo já decidiu que ele não serve mais.
e nada, absolutamente nada, é mais cruel do que isso.

e tem o kevin spacey, antes de cair da graça e virar lenda maldita. aqui, ele é perfeito… frio, burocrático, sem alma. o gerente que mede o valor de uma vida em leads. não tem sangue nas veias. tem café requentado e ressentimento.

e ed harris e alan arkin… dois homens encurralados, debatendo se vale ou não trapacear, se ainda dá pra ter algum senso de certo e errado num sistema onde a ética é uma piada contada por chefes rindo num campo de golfe.

mas veja bem… glengarry glen ross não é sobre personagens. é sobre nós.
é sobre o que nos tornamos quando nos dizem que temos que ser vencedores o tempo todo.
é sobre o teatro da performance.
é sobre fingir que está tudo bem enquanto a alma escorre pelo ralo junto com o resto da tua sanidade.

e por que você TEM que ver esse filme?
porque ele é uma ofensa direta a todo esse culto ridículo ao empreendedorismo tóxico, à positividade falsa, às frases de “seja seu próprio chefe” estampadas em camisetas feitas na china por pessoas que ganham menos por hora do que você gasta num pão de queijo gourmet.

esse filme é uma carta de amor ao fracasso.
e um aviso… se você não aprender a sobreviver nesse sistema, ele vai te devorar.
não com um rugido. mas com um bocejo.
porque você é só mais um.
mais um tentando parecer forte.
mais um fingindo que ama o que faz.
mais um achando que a próxima venda vai mudar tudo.

mas não vai.

e esse é o verdadeiro poder de glengarry glen ross.
ele não quer te confortar.
ele quer te acordar.

e se você ainda acha que precisa de um coach… então você não entendeu nada.
e nem vai.


e ontem, quando me perguntaram, de forma sincera, direta…. “qual papel você quer ocupar nesse projeto?”
e eu respirei fundo. porque não se trata de querer ser o melhor vendedor, o mais esperto da sala, o que fecha mais contratos ou leva o maldito cadillac do mês. já vi esse filme. já estive nessa sala. já ouvi o discurso. já vi o olhar desesperado de pessoas tentando vender qualquer coisa, até a própria dignidade… pra continuar no jogo.
e é justamente por ter visto, por ter sentido o cheiro do carpete molhado de suor e humilhação, que minha resposta veio nesse texto…
não quero ser mais um dentro da engrenagem. não quero repetir os rituais da performance cega, nem disputar faca de churrasco em troca de aceitação.
se é pra estar num projeto, que seja com olhos abertos, com sangue nas mãos e verdade no coração. ok ficou poético…. nem me reconheci agora…
não quero ser ricky roma, nem shelley levene, nem williamson, nem moss.
quero ser quem assiste tudo aquilo… e decide fazer diferente.
não por arrogância.
mas porque tô acordado.
e porque alguém, em algum momento, tem que ter a coragem de não jogar o mesmo jogo.
alguém tem que criar outro.

fim.
e, se me permite: mic drop.

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2025

o que estava tramando?

eu vou ensinar marketing e inteligência artificial.
mas não do jeito que os gurus querem. não com aquele tom de voz sussurrado de quem acha que tá revelando os segredos do universo enquanto repete o mesmo carrossel reciclado que você já viu mil vezes no instagram.

eu vou ensinar o marketing de verdade. o marketing que funciona, que converte, que vende sem prometer cura pra dor nas costas ou transformação de vida em sete dias. vou ensinar como usar ia pra construir tudo… da marca à porra da legenda do post. vou mostrar como criar, escrever, pensar, automatizar, testar, ajustar, refinar e escalar com inteligência, não com fé, choro ou workshop de final de semana num coworking com cheiro de pão de queijo requentado.

e vou fazer isso por R$ 9,99 por mês.
sim, nove e noventa e nove. preço de uma esfiha triste na lanchonete da rodoviária. e não, não tem pegadinha. não tem “grupo exclusivo” que você precisa pagar R$ 297 pra entrar. não tem curso extra, upsell, clube do networking, evento presencial num hotel com carpete fedido. tem só o que interessa… conteúdo útil, tático, mastigado e aplicado com ia no centro de tudo.

eu vou mostrar como a ia é o braço que você não tem, o funcionário que nunca reclama, o sócio que trabalha de madrugada. e mais do que isso… vou ensinar a pensar com ia. a usar ela como extensão do raciocínio, da estratégia, da porra da criatividade que o mercado já tentou te roubar com fórmula.

e ao fazer isso, eu vou cometer uma heresia.
porque os vendedores de ilusão vão me odiar. os papas do funil perpétuo vão chiar. os donos da “comunidade premium” vão me chamar de irresponsável. porque eu tô abrindo a porteira. tô entregando tudo que eles empacotam por R$ 5 mil, R$ 10 mil, R$ 20 mil, num plano mensal que custa menos que a assinatura da netflix.
e a diferença é que o meu conteúdo não é ficção.

vou cuspir na cara dessa indústria gourmetizada que enche linguiça com storytelling de infância traumática, enquanto vende um curso feito no canva. vou atropelar o script do “se valorize” e jogar a real… o que vale é saber fazer. e eu vou ensinar a fazer. com ia. com profundidade. com método. com provocação.

porque no fim das contas, não é só sobre ensinar marketing e ia.

é sobre desmontar o circo.
é sobre devolver a inteligência pra quem nunca teve acesso.
é sobre pegar essa porra toda e dizer: “toma. faz. agora você não tem mais desculpa.”

e aí eu quero ver quem vai ter coragem de continuar vendendo milagre, quando todo mundo já souber fazer mágica.

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2025

ambição

tá. vamos começar com a pergunta que ninguém tem coragem de responder sem encher de emoji e aforismo de palestra… por que você quer tanto?
não, não me venha com essa baboseira de “realização pessoal”, “deixar legado”, “inspirar os outros” esse tipo de frase só convence idiota que lê biografia de bilionário achando que é manual de iluminação espiritual. a real é que você quer porque você precisa parecer alguém. você quer porque tem medo de não ser nada. medo de não ser visto. medo de ser mais um. medo do anonimato. e aí veste esse medo, coloca no crachá, estampa no perfil e chama de “carreira”.

o nome disso é desespero com branding.

não tem nada de nobre em querer crescer se o que te move é essa sensação permanente de vazio que você herdou de uma infância sem aplauso.
mas ninguém fala disso. então você continua correndo. correndo feito um rato de laboratório numa esteira que só gira, gira, gira… e não leva a lugar nenhum além do espelho. aquele espelho que te devolve a imagem de alguém sempre cansado, sempre faminto, sempre prestes a desmoronar por dentro… mas com a porra do linkedin atualizado.

e sabe quem já sabia disso? bud schulberg. lá em what makes sammy run?, ele desenha com sangue o retrato do ambicioso profissional… sammy glick. um verme carismático que sobe pisando em tudo, mastigando os outros, cagando pra integridade, arte ou verdade. tudo que importa é a próxima escada. a próxima porta. o próximo aplauso. ele não quer fazer algo bom. ele quer que digam que ele é bom.
soou familiar?

esse é você.
sou eu.
é todo mundo que já trocou o prazer de criar pela expectativa de ser notado.

e por que isso acontece? porque você não tá ambicionando pelo topo, você tá tentando tapar um buraco. c.s. lewis, que era mais lúcido do que metade desses filósofos instagramáveis, explicava isso com clareza. tem o amor que vem da plenitude, de quem transborda e compartilha, e o amor que vem do vazio, da falta, da carência… esse que se disfarça de zelo, de dedicação, mas que na verdade é só um grito interno por validação. é o amor da tal sra. fidget… aquela que cuida de todo mundo só pra poder lembrar todo dia o quanto ela sofreu.
sabe aquela sua entrega absurda ao trabalho? aquela dedicação “irrestrita”? talvez seja só carência com crachá e reunião de alinhamento.

você tá tentando ser alguém porque tem medo de ser ninguém.

e a ambição se alimenta disso. ela se veste de propósito, mas te prende numa esteira. uma esteira que nunca para. uma esteira que te faz acreditar que excelência é o mesmo que estar à frente. e aí entra o vírus da superioridade.
você já não quer ser bom. quer ser melhor. melhor que o coleguinha, que o primo bem-sucedido, que a amiga fodona que posta no instagram direto de bali. você quer ganhar. mas nem sabe mais o que é o prêmio.

miroslav volf fala que essa busca frustrada por ser superior transforma você num mentiroso, daqueles que precisa convencer o mundo de que quem ficou pra trás não só perdeu, como merecia perder. arrogante, preguiçoso, burro, medíocre. porque se você admitir que o outro era bom, que ele só teve outro caminho… então o que te sobra é sorte. ou pior… falsidade.

e sorte, no mundo da ambição, é ofensa.

e você segue. inventa narrativa. disfarça vício de mérito. tira selfie no palco, fala de “impacto social”, abraça causas que não entende só porque elas rendem engajamento e carisma. não é autenticidade, é marketing pessoal com pretensão moral. o legado que você quer deixar é só a casca, a embalagem. o conteúdo mesmo? um grande nada.

e por trás de tudo isso, o desejo… não pelo sublime, mas pelo tangível. não pelo sagrado, mas pelo carro, o título, o post viral. os desejos altos você até finge ter, mas o que te move mesmo é a contagem de seguidores, o salário com dois dígitos antes da vírgula, o crachá que impressiona no jantar de família. santo agostinho dizia… “você se torna aquilo que ama.” e se você ama status, parabéns. virou um número. um dado de rh. uma máquina de entrega sem alma.

e talvez, lá no fundo, você até saiba disso.

talvez por isso o sono venha quebrado, a respiração curta, o fim de semana cada vez mais silencioso. talvez por isso você ache que precisa de “imersão de autoconhecimento” ou de um retiro num lugar com nome em sânscrito. mas o problema não é falta de paz. é excesso de mentira. mentira que você contou pra si mesmo quando trocou aspiração por ambição.

porque são coisas diferentes.

ambição é querer subir.
aspiração é querer ser.
a primeira te torna produto.
a segunda te obriga a ser humano.

e ser humano, hoje, é quase uma heresia.

walter kirn entendeu isso quando largou o teatro da performance e decidiu, doente e exausto, só aprender. sem tentar impressionar, sem tentar vencer. só ficar em silêncio e ser preenchido.
mas isso não vende.
não viraliza.
não dá palco.

e o mundo é um palco.

então você vai continuar correndo, cansado, faminto. vai continuar se enganando. se promovendo. se sabotando. vai continuar se chamando de “ambicioso” como se isso fosse elogio, enquanto tudo dentro de você grita por descanso, por verdade, por uma porra de um dia sem performance.

e talvez um dia você pare. talvez não.
mas se parar…
não espere aplausos.

só silêncio.
e quem sabe, pela primeira vez em muito tempo, paz.

mas só se tiver coragem de largar o palco e encarar o que sobrou nos bastidores.

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2025

a verdade está lá fora

eu cresci acreditando que a verdade estava lá fora. numa base militar secreta, num porão mal iluminado em washington, dentro de uma nave acidentada escondida no novo méxico ou, no mínimo, na mente perturbada de algum agente do governo entupido de café e paranoia. a tv me ensinou isso. e não só me ensinou, ela me treinou, como um bom cãozinho. ela apertou meu focinho contra a tigela quente da conspiração e disse “cheira isso. agora lambe.”

e eu lambi.

a verdade virou um fetiche intelectual, desses que você veste com orgulho na roda de conversa pra parecer mais esperto que os outros. a verdade nunca foi o objetivo, foi só o pretexto. o que vicia mesmo é o mistério. o suspense. o quase. aquele momento antes da cortina abrir, que nunca abre, claro… porque a graça tá justamente aí, no jogo de pistas falsas, de mensagens codificadas, de mapas com o “x” que nunca chega a lugar nenhum. um vício como outro qualquer, só que com legenda e trilha sonora atmosférica.

mas a televisão, esse oráculo moderno com botox e pós-produção, não inventou a conspiração. ela só pegou o medo ancestral, aquele medo de estar sendo enganado, manipulado, usado… e serviu em alta definição, episódio após episódio, até isso virar nossa dieta cultural básica. a dúvida virou entretenimento. a paranoia, um gênero. e nós, com o controle remoto na mão e a cabeça fervendo de suspeitas, fomos nos acostumando com essa ideia reconfortante, não existe acaso, tudo tem uma razão. e se não tem… a ausência é a prova.

e aí vem o problema. porque quando tudo parece parte de um plano secreto, qualquer explicação simples soa burra. ou pior, soa como parte do plano. então a verdade oficial virou piada. e o cidadão médio, viciado em narrativas complexas, começa a procurar lógica em cada sombra, em cada tropeço, em cada atraso no correio. a série acabou? a resposta foi frustrante? então deve ser porque alguém não queria que você soubesse. o showrunner? os estúdios? a deep web? o vaticano? tanto faz. o importante é que a conspiração continua.

e enquanto isso, políticos, bilionários e líderes de seitas vestem o figurino de antagonista perfeito. ou de mártir, dependendo do gosto do freguês. é tudo roteirizado. o vilão que diz que é vítima. o herói que fala como um personagem de reality show. o povo assistindo de camarote, dividido entre quem acredita, quem finge que não acredita e quem ganha dinheiro vendendo camiseta com slogan críptico.

e quando a realidade tenta bater à porta com dados, provas, evidência concreta… ela é ignorada. ou remixada. a negação virou feature, não bug. a refutação é só mais um episódio. “eles querem que a gente acredite nisso”, diz o novo messias de cada esquina digital. e aí lá vai você, outra vez, mergulhado em vídeos pixelados, fóruns obscuros e aquele calorzinho no estômago de quem acha que está finalmente chegando . seja lá onde for “lá”.

a verdade está lá fora, sim. só que agora ela tá soterrada sob quinze temporadas de teorias, doze canais de youtube com thumbnails gritando, e uma multidão de convertidos que juram que tudo faz sentido, se você só olhar direito.

só mais uma pista. só mais um link. só mais uma live.

e quando você se dá conta, já não lembra mais quando foi a última vez que acreditou em algo simples. porque o simples, hoje, é o novo absurdo.

parabéns. você está acordado. bem-vindo ao show.

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2025

sobre ela

nunca fui de aprender com facilidade. me distraía com barulhos, com o mundo lá fora, com as próprias urgências que eu inventava pra não encarar o que realmente importava. vivi muito tempo no automático, empurrando, desviando, rindo quando era mais fácil do que sentir.
e aí veio ela. sem fazer barulho. sem anunciar nada.

ela chegou e foi abrindo janelas que eu nem sabia que existiam.
não me ensinou com discursos. me ensinou com presença.
e o que eu aprendi com ela não coube em livros nem em conselhos. foram três coisas. só três. mas três que mudaram tudo.

primeiro, ela me ensinou a entender meu mundo interno.
olhar pra dentro, de verdade. não aquela introspecção teatral que a gente posta por aí pra parecer profundo, mas o tipo de mergulho que incomoda, que revira, que transforma.
ela me fez perceber que não adianta tentar consertar o mundo se eu não tiver coragem de abrir as portas do meu próprio silêncio.
e, mais do que isso, ela me ensinou que há beleza no caos. que a bagunça interna não é um erro, é um mapa. e que entender isso muda tudo.

depois, ela me ensinou a assumir responsabilidade. radical, absoluta, sem vírgulas.
ela nunca me disse “a culpa é sua”. ela só me mostrava, com o jeito dela, que tudo o que eu fazia, ou deixava de fazer, era escolha minha.
me fez ver que apontar o dedo pros outros era só uma forma de não crescer.
e crescer, com ela, virou não uma obrigação, mas uma possibilidade.
não se tratava de culpa, se tratava de poder.
e eu nunca tinha me sentido tão forte quanto quando comecei a admitir minhas próprias falhas.
ela me fez querer ser responsável, porque ela acreditava que eu podia ser.

e por fim, ela me ensinou a dançar com a impermanência.
ela nunca quis controlar o ritmo da vida.
ela me ensinou a respirar fundo nos altos, e a confiar nos baixos.
a aceitar que há dias em que tudo flui, e outros em que tudo trava e que nenhum dos dois dura pra sempre.
ela não luta contra a maré. ela observa, acolhe, se adapta.
e com isso, eu fui aprendendo a fazer o mesmo.
com ela, aprendi a não temer os invernos.
porque ela sempre soube que tudo floresce de novo. até a gente.

não é sobre perfeição.
ela não veio pra me salvar.
ela veio pra caminhar comigo enquanto eu aprendia a salvar a mim mesmo.

ela me ensinou, com a calma de quem sabe o tempo das coisas,
que viver não é controlar tudo.
é sentir tudo.

e, por algum milagre ou teimosia do destino, ela me escolheu pra caminhar ao lado dela.
com todas as minhas dúvidas, todas as minhas falhas, todas as partes que ainda estavam por costurar.
e ainda assim… ela ficou.
e eu aprendi.

ela me ensinou.
e por isso, eu sou, finalmente, eu.

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2025

f1 na globo

a fórmula 1 tá voltando pra globo. sim, aquele canal que um dia achou que corrida de domingo era tão importante quanto novela das oito mas que depois largou a categoria como quem troca uma lasanha por salada. e agora, anos depois, volta feito ex-namorado arrependido, não por amor, mas porque a band fez o impossível… devolveu a alma pro esporte e agora o povo sente falta.

mas calma, não se empolga. porque o retorno é tipo abrir a tampa de uma marmita requentada às pressas… parece apetitoso no anúncio, mas é só enganação plastificada. só 15 corridas na tv aberta. o resto… trancado atrás do portão da sportv, escondido no globo.com, vendendo a emoção da corrida como se fosse ingresso pra balada vip.

quer ver tudo? paga. quer ver a classificação? paga. quer ouvir barulho de motor? paga também. quer emoção de verdade? azar o teu.

e aí vem o golpe final… mariana becker não volta. pronto. acabou. fecha a conta, passa a régua. aquela mulher que dava mais credibilidade de paddock do que muito chefe de equipe com 40 anos de grid, aquela que falava com piloto, engenheiro, mecânico, dono de equipe, o zelador do box da red bull foi descartada como se fosse extra de cena que já deu o take.

porque a globo, preferiu alguém “da casa”. dizem que a cotada é júlia guimarães. mas a mariana becker, era faca na bota.

ela atravessava tempestade com o microfone na mão, fazia link ao vivo no meio do incêndio e ainda te dizia quem tava com o pneu errado na volta 38. ela era rock’n’roll numa cobertura que agora vai virar mpb de consultório odontológico.

e os fãs? os fãs tão cuspindo fogo. a internet virou zona de guerra. “era melhor na band”, dizem os que ainda têm memória. porque na band tinha suor, tinha erro, tinha improviso mas também tinha gente que parecia gostar da porra da corrida. agora, vai ter um monte de narrador que estudou f1 pra fazer vt, falando do verstappen como se fosse o galã do mês no gshow.

a globo tá vendendo fórmula 1 como vende camisa de time em loja de shopping… sem paixão, sem história, só com código de barras. e tá todo mundo fingindo que tá tudo bem.

mas não tá. sem mariana becker, sem transmissão aberta decente, sem respeito pelo torcedor que acordava domingo às seis da manhã pra ver carro fazendo curva em monza, o que sobrou é só mais um produto da vitrine global, igualzinho aquele café gelado que custa 18 reais e tem gosto de desespero.

então parabéns, globo. vocês conseguiram. pegaram uma paixão nacional e transformaram num link patrocinado.

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2025

i.s.r.u

tá nos documentos da nasa.
isru: in-situ resource utilization.
um nome pomposo pra algo que, no fundo, é puro instinto.
não é tecnologia, é sobrevivência.
é a arte, e a teimosia, de não levar tudo de casa.
de não depender da terra pra continuar respirando quando você estiver a 200 milhões de quilômetros de distância.

os engenheiros escrevem relatórios sobre isso, discutem em painéis e simpósios.
mas pra mim, isru nunca foi só sobre marte, ou a lua, ou o próximo asteroide mineralizado.
pra mim, isru é a essência do que significa estar vivo, agora.

isso virou meu modo de operar.
não é sobre ter todos os recursos.
é sobre extrair deles tudo o que é possível.
é sobre olhar ao redor, às vezes pro nada, e mesmo assim começar a construir.

porque a vida, cara… a vida real, aquela que te cobra mesmo quando você tá quieto, raramente entrega o pacote completo.
ela joga meia chance, um pedaço de ferramenta, um terreno quebrado e diz… se vira.
e isru é isso.
é o se vira elevado à filosofia.
é não esperar.
é não depender.
é não reclamar.
é olhar pro improvável e dizer: ok. vai ser daqui mesmo.

eu vivo assim porque não sei viver de outro jeito.
não espero mais o cenário ideal.
não acredito em momento certo.
acredito em começar agora, com a bagunça que tiver, com o que sobrou, com o que ninguém quis.
e transformar isso em impulso.

é isso que isru me ensinou.
que liberdade não é conforto.
é autonomia.

e isso, pra mim, é muito mais do que uma estratégia espacial.
é uma filosofia de rua.
de vida.
de quem acorda todo dia num mundo que não te deve nada, mas mesmo assim oferece matéria-prima se você souber onde cavar.

então não.
não é sobre marte.
é sobre mim.
é sobre você.
é sobre todo mundo que já teve que levantar sem ter tudo pronto e, mesmo assim, foi lá e fez.
é sobre transformar escassez em estrutura.
limite em caminho.
e silêncio em resposta.

isso é isru.
não é só uma sigla da nasa.
é uma escolha.
e eu escolho viver assim.
com o que der.
com o que tiver.
com o que for.

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2025

minha autobiografia

ninguém me pediu pra escrever minha autobiografia.
mas eu escrevi.
e foda-se.

porque se eu esperasse o mundo estar pronto pra minha versão da história, eu ainda estaria na sala de espera de alguma consultoria medíocre, sorrindo pra um gestor que acha que cultura é mural colorido e pizza na sexta.

então aqui está…
minha versão.
sem cortes.
sem suavização.
sem a narrativa envernizada que cabe num carrossel de cinco passos pro sucesso.

eu comecei como todo mundo começa… com fome.
mas não aquela fome romântica de quem quer “mudar o mundo”.
a minha era outra.
era fome de entender.
de mergulhar no que pulsa por trás das marcas, das campanhas, dos briefings escritos por gente que nunca olhou pra dor de verdade.
era fome de buscar sentido onde só tinha verniz.

e eu entrei nesse mercado achando que ia criar coisas que importam.
e o que encontrei foi um mundo viciado em superfície.
em estética.
em resultado trimestral.
gente que mede valor pelo número de curtidas.
ideias formatadas como produto.
criatividade encaixotada, em série, como se fosse linha de montagem de storytelling automatizado.

mas mesmo assim, eu fiquei.
porque ali, no meio daquela podridão com aroma de café requentado e frases motivacionais coladas na parede com fita dupla face,
eu vi espaço pra ser tudo que eles não esperavam.

eu nunca fui o funcionário ideal.
fui o ruído no fone.
a pausa desconfortável na reunião.
aquele que te olha e diz, isso aqui tá errado, vamos fazer do nosso jeito e eles que se fodam.
e se você não aguenta essa conversa, você também não vai aguentar o que vem depois.

me chamaram de intenso.
e eu aceitei.
melhor do que ser raso.

me chamaram de complicado.
e eu respondi… não fui feito pra ser simples.

me chamaram de difícil.
mas só porque eu não aceito viver fácil.

eu recusei o jogo.
o teatrinho do colaborador exemplar.
o falso coleguismo de reuniões mornas.
o sorriso político da agência que finge que ama o cliente enquanto sangra por dentro.

eu escolhi o desconforto.
escolhi mergulhar até onde ninguém queria ir.
escolhi sentir cada criação como uma extensão da minha identidade.
e por isso mesmo, cada entrega minha carrega algo que você não encontra fácil por aí…
presença.
intensidade.
vida.

e também… dor.
porque não dá pra criar algo que vale a pena sem perder um pouco de si.
não dá pra construir algo real se você só toca o mundo com luva de proteção emocional.

então sim, eu empreendi.
falhei.
recomecei.
não com a pose do herói da capa da forbes,
mas com a cara suja de alguém que atravessou o inferno da incerteza,
voltou com uma ideia na mão e ainda ouviu de volta…
“mas qual é o roi disso?”

e mesmo assim, eu continuei.

porque eu não sou movido por aceitação.
sou movido por necessidade.
pela urgência de fazer algo que não seja só bonito,
mas que mude algo dentro de alguém.
nem que seja só dentro de mim.

e sim, eu sou contraditório.
sou idealista e cínico na mesma frase.
sou profundamente apaixonado por comunicação e completamente enojado por como ela é tratada.
sou um artista acidental num mercado que premia pose.
sou uma tempestade vestindo crachá. e aliás, nunca usei e nunca usarei crachás.

e enquanto me pedem pra “otimizar processo”,
eu quero mesmo é explodir a lógica.
porque onde todo mundo busca padrão,
eu busco fratura.
onde eles veem métrica,
eu vejo víscera.
onde eles querem encantamento,
eu quero desconforto.

porque talvez a função de quem ainda tem alma nesse jogo
não seja agradar.
seja provocar.
seja deixar um silêncio incômodo depois que todo mundo saiu da sala.
seja fazer com que pensem…
“eu não entendi tudo que ele fez,
mas eu senti.”

e é isso que eu sou.
não um profissional.
mas uma presença.
não uma marca pessoal.
mas um ruído persistente no meio do feed.

então se um dia me pedirem uma autobiografia…
a resposta já tá escrita.

ninguém pediu.
mas eu fiz.
e foda-se.