
vivemos na era da manchete performática e da verdade opcional. uma espécie de reality show da informação onde ninguém quer saber se é verdade, só se rende. o jornalismo, coitado, já não tem mais vergonha de repetir o que ouviu no banheiro do aeroporto, desde que a frase venha com aspas e gere tráfego. o critério editorial virou a pergunta: isso vai render cliques? e não isso faz sentido?
a essa altura, o ciclo é simples. alguém solta uma frase absurda, uma promessa, uma denúncia, uma previsão apocalíptica. o veículo publica sem apurar. os portais replicam. o público reage. e quando tudo desmorona, quando se descobre que era tudo fumaça de gelo seco, ninguém se responsabiliza. apenas seguem em frente, como se não tivessem acabado de plantar mais uma semente de ignorância em solo fértil.
a candidatura fake do felipe neto foi só mais um episódio nesse circo ambulante. a imprensa não só noticiou como debateu, teorizou, levantou chances reais. tudo com a mesma seriedade de quem cobre guerra ou eleição presidencial de verdade. e quando ele apareceu dizendo “era só uma publi”, a reação foi um bocejo coletivo. ninguém pediu desculpa por ter bancado o arauto do delírio. ninguém refletiu sobre o papel de transformar um golpe publicitário em fato político. só trocaram de pauta, como quem troca de canal quando o programa fica sério demais.
mas esse caso não foi exceção. é a nova regra. é assim com tudo. desde celebridade anunciando que vai morar em marte, até deputado jurando que o aquecimento global é invenção da onu pra vender ventilador. se tiver apelo, vira notícia. se viralizar, vira verdade temporária. e se for desmentido? quem se importa? o público já se inflamou, já compartilhou, já se sentiu parte de algo. a verdade chega tarde demais, ofegante, com cheiro de naftalina.
o mais brilhante… e por brilhante, entenda patético, é que isso tudo é tratado com naturalidade. como se não estivéssemos todos mergulhados num caldo ralo de desinformação temperado com superficialidade. como se não fosse grave o bastante termos veículos tradicionais servindo como correia de transmissão de falas sem contexto, sem verificação, sem consequência. não se noticia mais o que é, mas o que se disse. e isso basta. virou padrão. basta fulano afirmar algo, e já temos matéria. não interessa se fulano é especialista ou se tá fazendo live no porão com boné de alumínio.
e aí, o que era pra ser jornalismo vira fanfic institucional. tudo publicado com um verniz de credibilidade, mas com a profundidade de um tweet mal escrito. e se alguém ousa duvidar, questionar, pedir apuração? é tratado como chato, antiquado, analógico. “relaxa, é só uma nota rápida.” como se o fato de ser rápido justificasse ser raso. como se o jornalismo tivesse virado um drive-thru da ignorância.
e claro, o público também colabora. consome tudo com a mesma voracidade de quem compra ingresso pra ver tragédia encenada. quer emoção, quer indignação pronta, quer narrativa que caiba num reels. não quer nuance, não quer dúvida, não quer a chatice da realidade. quer confirmação. quer aquilo que reforça sua versão dos fatos, mesmo que os fatos estejam gritando por socorro do outro lado da rua.
o problema nunca foi a mentira existir. o problema é ela ter plateia, roteiro, figurino e patrocínio. e quando a imprensa, que deveria ser o filtro, vira o megafone, temos não só um colapso ético, temos um colapso funcional. porque se tudo é noticiável, então nada é verificável. e se nada precisa ser confirmado, então qualquer um pode dizer qualquer coisa, e ser levado a sério por vinte minutos até que a próxima loucura chegue.
isso não é imprensa livre. isso é imprensa perdida. uma máquina de replicar ruído, travestida de guardiã da informação. um coral de papagaios editoriais, repetindo o que ouviram sem sequer saber de onde veio.
e no fim, a gente ainda finge surpresa. como se não fosse previsível. como se não soubéssemos que a verdade hoje vale menos do que uma thumb bem feita com fonte impact. como se não estivéssemos todos, coletivamente, empurrando essa carroça de desinformação ladeira abaixo, só pra ver até onde vai dar.