o fetiche moderno pela instantaneidade. essa obsessão patética por respostas imediatas. vivemos numa época em que a pausa, o silêncio e até a reflexão foram transformados em sinais de descaso ou afronta pessoal. porque, claro, como ouso demorar cinco, dez, quinze minutos para responder, quando você, na sua grandiosidade, decidiu me agraciar com uma mensagem? é quase como se eu tivesse cometido um crime de lesa-majestade.
mas vamos ser honestos: essa pressa, essa mania de “visualizou e não respondeu”, é a personificação de uma sociedade mimada. ninguém quer entender que o mundo não gira em torno de suas urgências. e aqui vai uma novidade para você: meu tempo não é um drive-thru de fast food emocional, onde você faz um pedido e espera que eu entregue a resposta na velocidade de uma batata frita murcha. eu gosto de pensar, refletir, até ponderar se a sua mensagem sequer merece minha atenção. e, sim, às vezes eu decido que ela não merece. que horror, não?
vivemos numa realidade onde a profundidade está morta. as pessoas não querem uma resposta bem pensada, articulada, ou – deus me livre – interessante. elas querem um “sim”, um “não”, um “kkk”, qualquer coisa para sustentar a ilusão de que são importantes o suficiente para merecer prioridade na sua vida. mas aqui vai o choque: eu não funciono assim. eu não sou um algoritmo, e meu cérebro não opera no ritmo do wi-fi. se você acha que precisa de uma resposta minha em tempo real, talvez o problema não seja minha demora, mas a sua incapacidade de lidar com o próprio tédio. já pensou nisso?
e vou além: responder rápido é supervalorizado. sabe o que vale mesmo? responder direito. mas para isso, eu preciso de algo que está em extinção: tempo. tempo para processar, para pensar, para decidir se eu realmente quero investir energia em você ou no que você está perguntando. porque, no final das contas, responder rápido é fácil, qualquer um faz. o que é raro – e, vamos ser sinceros, muito mais valioso – é responder com conteúdo. e isso, meu caro, exige paciência. algo que, pelo visto, você não tem.
então, a próxima vez que eu “demorar” para responder, aproveite o momento para refletir sobre a sua dependência desesperada por atenção imediata. talvez você aprenda algo. ou, quem sabe, descubra que o silêncio pode ser bem mais interessante do que qualquer mensagem que eu poderia mandar.
o fascinante espetáculo dos entusiastas do trabalho. você sabe do que estou falando: aquele ser humano iluminado que trata o ambiente corporativo como se fosse o palco principal da broadway. o tipo de pessoa que acorda às 5h da manhã para correr uma maratona metafórica enquanto recita frases de motivação do tipo “você é o dono do seu destino” no espelho do banheiro. essas criaturas, radiantes de energia e positividade, exalam um entusiasmo que não só cansa, mas sufoca a alma de quem está apenas tentando sobreviver ao dia.
o problema dessas pessoas não é que sejam felizes no trabalho (o que já seria motivo suficiente para suspeitas). é a forma como querem espalhar essa empolgação tóxica como um vírus. elas não conseguem simplesmente amar o trabalho em silêncio; precisam fazer você amar também. é o tipo de gente que transforma a reunião da manhã em uma espécie de comício motivacional, onde cada deadline é uma “oportunidade de crescimento” e cada planilha do excel é uma obra de arte em potencial.
e vamos combinar: não é só exaustivo, é desonesto. porque ninguém — ninguém — pode ser genuinamente tão apaixonado por bater ponto, preencher relatórios e lidar com clientes passivo-agressivos. se você está transbordando de alegria às 18h de uma terça-feira, com certeza está mascarando alguma crise existencial profunda. talvez seja uma tentativa desesperada de se convencer de que todo esse esforço vale a pena, que o sistema não te engoliu completamente. ou, pior, talvez você realmente acredite nesse teatro.
e o mais insuportável? eles esperam reciprocidade. não basta você fazer seu trabalho. você precisa fazer com entusiasmo, sorrindo, como se cada tarefa fosse um presente divino. se você não está com a mesma energia delirante, você é “negativo”, “resistente à mudança” ou, minha favorita, “falta espírito de equipe”. espírito de equipe? sério? meu espírito está ocupado tentando não se atirar pela janela enquanto você faz um monólogo sobre “alavancar sinergias”.
essas pessoas cansam porque são como quem mastiga de boca aberta: não dá para ignorar. elas monopolizam o oxigênio do ambiente com sua energia hiperativa, deixando pouco espaço para qualquer outra emoção. se você está apenas tentando navegar o caos diário, sem medalhas de ouro de “melhor funcionário do mês” no horizonte, elas te fazem sentir como o chato da turma. mas aqui está o segredo: você não é o problema. elas são.
porque a verdade é que trabalhar deveria ser um meio para viver, não o propósito da vida. e essas pessoas que tratam o trabalho como religião estão perdendo a melhor parte da existência: o prazer de desligar, de desacelerar, de não dar a mínima para uma meta corporativa. então, da próxima vez que aquele colega hiperativo aparecer com um sorriso brilhante às 8h e um discurso sobre “fazer a diferença”, lembre-se: quem está realmente vivendo a vida é você, com seu café frio e seu olhar de “só me deixem em paz até a hora do almoço”.
ah, o mantra do século 20: “o cliente tem sempre razão.” a pedra fundamental de toda uma geração de consumidores criados para acreditar que pagar por algo lhes confere não apenas direitos, mas uma espécie de imunidade divina. é a justificativa perfeita para transformar qualquer experiência de serviço em um espetáculo de tirania barata, estrelando o “cliente” – aquele pequeno déspota mal-informado, inchado de autoimportância e completamente sem noção do que está fazendo ou pedindo. porque, vamos ser honestos, o cliente quase nunca tem razão. ele só tem dinheiro. e, na maioria das vezes, nem isso direito.
essa filosofia maldita é o câncer silencioso do capitalismo de conveniência. foi ela que nos trouxe o cara que grita com a atendente do call center porque sua internet caiu, como se ela tivesse puxado o cabo de propósito para estragar o seu sábado. ou aquele que entra em uma loja de departamentos e transforma o vendedor em psicólogo, babá e saco de pancadas emocional porque “o atendimento deveria ser impecável” – enquanto ele mesmo não consegue nem dizer bom dia ou, sei lá, não ser um idiota completo. e quem nunca viu o clássico espetáculo do aeroporto, onde o cliente que perdeu o voo decide que é direito divino dele humilhar a atendente do balcão, porque, claro, ela controla o tráfego aéreo mundial diretamente de sua mesa de trabalho?
mas o mais insidioso dessa ideia de que o cliente tem sempre razão não é apenas o comportamento grotesco que ela incentiva. é o fato de que ela mina completamente qualquer possibilidade de diálogo real, de troca, de crescimento. porque, se o cliente está sempre certo, então ninguém mais pode estar. o especialista na área? não tem razão. o atendente que já viu essa situação mil vezes? não tem razão. o engenheiro que projetou o produto? também não. quem é que tem razão? o cliente, aquele especialista autoproclamado que leu meia dúzia de comentários na internet e acha que agora sabe mais do que qualquer profissional com anos de experiência.
e isso não para em lojas, empresas ou serviços. o vírus se espalhou para todos os aspectos da vida. professores que têm que aturar pais dizendo que o filhinho deles não precisa estudar matemática, porque “ele não gosta”. médicos que precisam ouvir palestras de pacientes que diagnosticaram a si mesmos no google e exigem tratamentos absurdos. designers gráficos que são obrigados a criar logos medonhos porque “o cliente quer que a fonte pareça mais… divertida.” (tradução: horrível.) é uma guerra constante entre quem sabe o que está fazendo e quem acha que sabe porque tem um cartão de crédito e uma opinião.
e por que isso acontece? porque vivemos em uma cultura que venera o consumo acima de tudo. o cliente é tratado como uma espécie de entidade sagrada, inquestionável, porque ele paga. e pagar é tudo que importa, certo? exceto que não é. pagar não te dá razão, assim como gritar com alguém não te faz mais inteligente. pagar te dá o direito de receber o produto ou serviço que foi prometido. ponto. não te dá o direito de ser um cretino, de ignorar a realidade ou de transformar o trabalho dos outros em um inferno.
então, aqui vai uma ideia revolucionária: e se o cliente não tivesse sempre razão? e se ele fosse apenas um humano como qualquer outro, capaz de cometer erros, de ser corrigido, de aprender? e se, em vez de reforçar essa ilusão de infalibilidade, começássemos a tratá-lo como alguém que, ocasionalmente, precisa ouvir um “não”? “não, senhor, seu filho precisa sim aprender matemática.” “não, esse logo vai ficar horrível.” “não, gritar com o atendente não vai trazer seu voo de volta.” talvez seja hora de perceber que o cliente não é deus. na maioria das vezes, ele é só um cara que precisa de um pouco mais de humildade – e, quem sabe, de um tapa metafórico de realidade.
há algo de profundamente exaustivo, quase claustrofóbico, em lidar com pessoas animadas demais. sabe do que estou falando, né? aquelas criaturas que parecem ter acordado após um banho de glitter, cheirado um balde de açúcar e decidido que a vida delas é um comercial de iogurte grego. elas são o equivalente humano de uma bomba de confete: barulhentas, pegajosas e impossíveis de ignorar. tudo é “amazing”, “incrível”, “uau”. como se o simples fato de estarmos respirando fosse digno de uma parada de carnaval.
é como dividir espaço com uma personagem de série ruim da netflix, onde todos os problemas podem ser resolvidos com “positividade” e um copo de matcha latte. sabe o que cansa? essa demanda constante de reciprocidade. porque, ao lado delas, você automaticamente se torna o cínico, o “de mal com a vida”. o problema nunca é o mundo, é você. “você só precisa mudar sua perspectiva!”, dizem elas, com um sorriso que parece fisicamente doloroso. não, minha querida. o problema não sou eu. o problema é que você está agindo como se tivesse descoberto a cura para o tédio existencial, quando claramente só está fugindo dele com toda essa efervescência insuportável.
não me entenda mal. eu não sou contra alegria. quem sou eu para negar a alguém o direito de ser feliz? mas essa felicidade performática, essa necessidade de empurrar sua euforia goela abaixo do resto da humanidade, isso me faz querer abrir um buraco na terra e me esconder. porque, vamos ser sinceros, ninguém é tão feliz assim. e, se for, isso me faz desconfiar seriamente do seu equilíbrio emocional.
às vezes, tudo o que eu quero é sentar em silêncio. contemplar a existência com um pouco de melancolia, talvez uma taça de vinho tinto. mas não. lá vem a tropa de choque do “vibe positiva” com suas frases de almanaque: “você só vive uma vez”, “pense no lado bom”. honestamente? o lado bom da vida é que essas pessoas, eventualmente, vão embora. e eu vou poder voltar a ser um ser humano funcional, sem me sentir um Grinch por simplesmente não querer participar do circo delas.
então, não, não sou “negativo”. eu só prefiro viver num tom menos ensurdecedor. e, se isso faz de mim um insuportável, que assim seja.
me sento num café como quem ocupa um trono improvisado numa ópera barata. não um desses cafés meticulosamente planejados pra parecerem autênticos, com menus escritos à mão e plantas estrategicamente colocadas como se tivessem crescido ali por acidente. não, eu escolho aqueles lugares honestos, quase feios, onde o café tem gosto de mágoa e a mobília parece ter sobrevivido a uma guerra – mas mal. o tipo de lugar onde os donos desistiram de fingir que se importam. e eu? eu me sento, com minha xícara de café amargo e frio, e começo meu esporte favorito: dissecar as vidas das pessoas ao meu redor, transformando-as em personagens de histórias que elas nunca vão saber que existiram.
começo pelo homem de terno cinza, sentado sozinho, com uma pasta de couro que parece pesada demais para ele carregar. ele não está tomando café, mas whisky. às dez da manhã. na minha cabeça, ele é um advogado de segunda categoria que aceitou um trabalho que nunca deveria ter aceitado. algo sujo, envolvendo políticos e dinheiro vindo de lugares onde ninguém fala inglês. agora, ele está pagando o preço. literalmente. aquele homem de jaqueta preta no balcão? não está lá por coincidência. ele é uma sombra. um aviso. o advogado sabe que sua vida vale menos do que os números nos cheques que assinou. ele toma o whisky devagar, tentando decidir se pega o trem para casa ou foge para um país sem tratado de extradição.
na mesa perto da janela, uma mulher com um casaco vermelho, elegante, mas discreto. ela mexe no chá, mas não bebe. só olha para ele, como se estivesse esperando que algo acontecesse. ela carrega uma bolsa pequena, tão surrada quanto o café em que estamos. na minha versão, ela é uma ladra. não daquelas que invadem bancos ou casas de milionários, mas uma especialista em furtos quase imperceptíveis. carteiras, relógios, um colar que escorrega do pescoço de uma vítima desatenta. ela tem um olhar clínico, analisa o ambiente como um jogador de xadrez. mas hoje algo está errado. ela está hesitante. talvez tenha cruzado a linha com alguém que não deveria, talvez tenha roubado a pessoa errada. e agora, está esperando. pelo quê, ela não sabe. talvez uma saída. talvez um perdão que nunca vai chegar.
e aquele casal no fundo, tão quieto que quase desaparece no cenário? ele, com o rosto marcado pelo tempo, mãos calejadas, e ela, com olhos que parecem ter chorado muito mais do que deveriam. eles não dizem uma palavra, mas a tensão entre eles é palpável. na minha história, eles são cúmplices de um crime. algo terrível, algo que começou como uma solução fácil e se transformou em um pesadelo. talvez um assalto que deu errado. ou talvez algo mais sombrio. um corpo que eles não queriam matar, mas mataram mesmo assim. agora, estão presos um ao outro, ligados pelo tipo de segredo que corrói por dentro. eles não confiam mais um no outro, mas também não têm ninguém além de si mesmos. ela mexe no anel de casamento como se fosse uma algema. ele olha para a porta como se esperasse a polícia a qualquer momento.
o barista, claro, é outra peça desse tabuleiro. jovem, tatuagens nos braços, um bigode que provavelmente consome metade do salário mínimo em manutenção. mas o olhar dele não é blasé como os de outros baristas pretensiosos. é agudo, atento. ele está prestando atenção em tudo e todos, como um diretor de cinema capturando cada movimento da cena. na minha versão, ele não é só um barista. ele trabalha para alguém. um chefão do submundo, talvez. cada café que ele serve é um código. um “americano duplo” pode significar que a entrega chegou. um “cappuccino sem espuma”? um alerta de que algo deu errado. ele anota os pedidos num caderno que parece inofensivo, mas é um mapa das operações clandestinas que acontecem sob o nariz de todos.
e os turistas? sempre há turistas. um homem de meia-idade, camisa polo, e uma câmera pendurada no pescoço como uma coleira. sua esposa, com um sorriso nervoso e roupas que claramente foram escolhidas para parecer “descontraídas”. mas eles não estão ali para ver a cidade. não realmente. na minha história, ele é um investigador privado contratado para seguir alguém. talvez um político infiel, talvez um empresário que está escondendo dinheiro. mas ele é ruim no que faz. visível demais. ela, por outro lado, é quem realmente está no comando. enquanto ele tira fotos desajeitadas, ela observa os alvos, faz anotações mentais, corrige seus erros. eles são um time, mas não um bom. e eles sabem disso.
e eu? fico ali, no canto, com meu café amargo e frio, observando o desfile. porque, sejamos honestos, o homem de terno cinza não é nenhum advogado corrupto lutando contra o peso dos pecados; ele provavelmente só perdeu o emprego e está esperando o bar abrir. a mulher de casaco vermelho não é uma ladra com dedos leves, é só alguém que gosta de parecer misteriosa enquanto decide se pede mais chá ou sai para fumar um cigarro. as pessoas são assim, sempre menos interessantes do que parecem. mas é aí que entro.
sem mim, o barista não passa de um cara entediado que odeia seu trabalho. e os turistas? bem, eles continuam sendo turistas, nada pode salvar turistas. mas na minha versão, eles têm camadas, conflitos, segredos. na minha versão, o mundo é mais cruel, mais bonito, mais verdadeiro.
porque, no final das contas, a verdade é tediosa. ninguém quer saber que o homem no canto só está esperando um telefonema que não vai chegar. querem drama, sangue, conspirações. e eu dou isso a eles, pelo menos na minha cabeça. não porque eles mereçam, mas porque alguém tem que transformar esse mundo em algo que preste.
o tempo, esse desgraçado invisível, virou uma espécie de deus moderno. todo mundo quer controlá-lo, economizá-lo, espremer cada segundo como se fosse o último gole de uma garrafa de vinho ruim. estamos obcecados, movidos por calendários digitais, agendas lotadas e aquele maldito senso de urgência que nos consome desde o momento em que abrimos os olhos. mas para quê? para chegar onde? para comprar mais lixo que vamos esquecer no fundo de uma gaveta?
e aí, no meio dessa balbúrdia, aparecem algumas marcas – poucas, quase extintas – que têm a ousadia de fazer o que ninguém mais faz: ignorar essa corrida idiota contra o tempo. elas não estão preocupadas com prazos impossíveis ou com a próxima tendência idiota que vai morrer antes do fim do mês. essas marcas fazem o que é raro, o que é quase revolucionário: respeitam o tempo. e, ao fazer isso, nos mostram que talvez a verdadeira elegância esteja em desacelerar e, deus me livre dizer isso, esperar.
não é só sobre qualidade, embora isso seja parte do charme. é sobre a história que cada peça carrega. é sobre entender que um bom produto – seja um casaco, uma bolsa, uma faca, ou um par de botas – não precisa ser reinventado a cada temporada. ele só precisa ser feito para durar, para resistir, para melhorar com a idade, como um bom queijo ou um bom whisky. essas marcas não estão aqui para te dar o que você quer agora. elas estão aqui para te dar algo que você ainda vai querer daqui a 20 anos.
e é aí que está a mágica: elas respeitam o processo. o couro é curtido como se fosse um ritual sagrado, não uma linha de produção que corre para atender a demanda do próximo natal. as costuras são feitas com mãos humanas, não máquinas frenéticas que tratam cada peça como um clone sem alma. não tem atalho, não tem pressa. cada passo importa, cada detalhe é pensado. e o resultado? algo que desafia o tempo, que te lembra que as melhores coisas da vida são aquelas que se recusam a ser efêmeras.
essas marcas são um dedo do meio levantado para a sociedade da pressa. elas não te dizem para correr mais rápido ou consumir mais rápido. elas te desafiam a parar. a pensar. a investir em algo que vai durar. porque, no final, o que vale mais? ter uma pilha de coisas baratas e esquecíveis ou um único item que carrega anos de história, suor e dedicação?
então, sim, talvez seja hora de revermos nossas prioridades. de pararmos de glorificar essa vida acelerada e começarmos a apreciar o valor do tempo bem gasto, seja ele em uma boa conversa, em uma refeição feita com amor, ou em algo tão simples quanto uma peça que foi criada para te acompanhar por toda a vida. porque o verdadeiro luxo, o único que realmente importa, é aquele que te faz lembrar que o tempo não é o inimigo. o inimigo somos nós, desperdiçando-o com pressa e mediocridade.
odeio o que fizeram com o café. odeio com uma intensidade quase poética, como quem observa a queda de um império antigo. o café, aquela bebida universal, o combustível da humanidade, foi sequestrado, mutilado, e transformado numa aberração moderna. não é mais sobre o sabor, o ritual, ou a necessidade de sobreviver ao dia. agora é sobre status, branding e frases idiotas como “triple shot oat milk macchiato”. sabe o que eu quero? um café que te olhe nos olhos e diga: “vai ser um dia difícil, mas aqui está minha contribuição.”
então, claro, temos o starbucks, a grande catedral dessa nova religião cafeeira. lá, o café não é uma bebida; é um espetáculo, uma identidade. você não está comprando café, está comprando a ideia de que pertence a uma tribo global, onde todos seguram aquele copinho verde com a sereia e acham que isso os torna interessantes. e o café? ah, sim, o café. uma poça de líquido carbonizado disfarçada por xarope de baunilha, montanhas de chantilly e calda de chocolate. tudo isso servido em um copo de papel que não só é desconfortável, mas parece ter sido projetado para vazar exatamente na hora em que você dá o primeiro gole. sofisticação? por favor.
mas o problema não para aí. vivemos na era da “gourmetização”, onde o café foi transformado em algo que exige um diploma em ciências sensoriais para ser apreciado. “notas de damasco com um final cítrico e corpo médio.” quem inventou essa palhaçada? café não tem corpo médio. tem corpo robusto e amargo, do tipo que te lembra que está vivo. e não, eu não quero que meu grão tenha sido “processado naturalmente por camponeses em altitude”. eu quero que ele tenha sido torrado até a alma e moído por alguém que sabe o que está fazendo. café é brutalidade líquida, não um passeio aromático por um pomar tropical.
e aí vem o show das cafeteiras. essas máquinas brilhantes, com painéis digitais que parecem saídos de um laboratório da NASA. elas prometem “a xícara perfeita” enquanto cobram o preço de uma pequena viagem internacional. ah, mas elas têm wi-fi! porque, claro, você precisa que sua cafeteira esteja conectada à internet. quem sabe ela envie uma notificação avisando que o café está pronto, como se o cheiro inconfundível não fosse suficiente. mas o que eu realmente quero é uma moka. aquela peça velha e confiável de alumínio que faz café com a mesma eficiência de um soco no estômago. simples, direta e sem nenhuma pretensão de ser mais do que é.
mas sabe o que mais me irrita? nós aceitamos isso. abraçamos o café descartável, a pressa, a superficialidade. trocamos a xícara de porcelana – sólida, aconchegante, quase sagrada – por um copo de papel que mal se segura. porque estamos sempre com pressa, sempre correndo, sempre “pra viagem”. e com isso perdemos a essência do café: o momento. o ato de sentar, respirar, e deixar o mundo desacelerar por um instante. café era um ritual. agora é só mais uma coisa que você consome enquanto responde e-mails e tenta fingir que tem controle sobre sua vida.
mas o café de verdade ainda existe. ele está escondido em cantos modestos, feito por mãos que não ligam para tendências ou grãos exóticos. está na garrafa térmica amassada de um caminhoneiro, na cozinha de uma avó, ou na xícara de quem ainda entende que café não precisa de firulas. precisa ser quente, forte e honesto. o resto? o resto é só espuma – e não, eu também não quero chantilly.
meu personagem favorito do charlie brown? fácil: linus. porque ele é o único naquela bagunça filosófica que realmente tenta fazer sentido do caos, enquanto todos os outros estão ocupados com seus próprios pequenos dramas patéticos. ele é o tipo de cara que aparece na sua festa com um cobertor de segurança e, de alguma forma, ainda sai como o mais sensato da sala. isso, claro, diz mais sobre os outros do que sobre ele.
linus é basicamente o hippie existencialista preso no meio de um sitcom de crianças neuróticas. ele carrega um cobertor – um cobertor, pelo amor de deus – como se fosse uma espécie de totem da sua sanidade. e aí você percebe: todo mundo tem seu cobertor, só que o dele é visível. snoopy tem fantasias de ser um ás de guerra (surreal e patético). lucy tem aquele senso inflado de superioridade que é basicamente uma armadilha emocional ambulante. e charlie brown… bem, charlie brown é uma ode viva ao fracasso. mas linus? ele é honesto sobre suas inseguranças, enquanto os outros fingem estar bem.
o mais brilhante em linus é que ele equilibra o ceticismo com uma boa dose de crença cega no great pumpkin. ele acredita no improvável, no impossível, como se fosse algum tipo de santo infantil. mas não é a fé que faz dele fascinante – é a coragem de manter essa crença mesmo sabendo, lá no fundo, que é tudo um grande teatro ridículo. e, claro, é um teatro. o mundo é uma piada cósmica, e linus está lá, no meio da plateia, rindo baixinho enquanto mantém seu cobertor apertado.
ele é o tipo de personagem que você olha e pensa: “esse moleque vai crescer e virar professor de filosofia em alguma universidade obscura.” ou talvez um escritor de manifestos que ninguém lê, exceto alguns poucos lunáticos que o consideram um gênio. ele é um outsider, mas não porque quer ser. ele só é esperto demais para se misturar e honesto demais para fingir que se importa.
então, sim, linus é meu personagem favorito. porque, no final das contas, ele é o mais humano de todos. cheio de contradições, esperanças absurdas e uma consciência dolorosa de que o mundo é um lugar frio e, ao mesmo tempo, cheio de possibilidades. além disso, ele tem o bom senso de carregar um cobertor para quando tudo der errado – o que, convenhamos, sempre dá.
tradições. eu as odeio e as amo com a mesma intensidade com que as pessoas comem peru seco no natal fingindo gostar. elas são ao mesmo tempo âncora e combustível, um lembrete insuportável do que já fomos e um grilhão que nos impede de seguir em frente. são como aquela cicatriz antiga: uma prova de sobrevivência, mas também uma lembrança de dor que você gostaria de esquecer. eu tento fugir delas, mas, de alguma forma, sempre volto rastejando. porque, no fundo, tradições são o que nos torna humanos. e também o que nos mantém miseravelmente presos à nossa própria estupidez.
vamos ser claros: tradições são, em sua essência, uma teimosia institucionalizada. o mundo muda, as pessoas mudam, tudo ao nosso redor está em constante transformação. mas lá estão elas, as tradições, com seus dedos ossudos agarrados ao “sempre fizemos assim”. é o grito de guerra dos medrosos, dos conformados, de quem prefere repetir o passado em vez de arriscar o desconhecido. “mas é tradição!” eles dizem, como se isso fosse uma justificativa. não é. é só a desculpa preguiçosa de quem tem medo de pensar, de evoluir, de admitir que talvez o que funciona para uns não funcione mais para outros.
e, mesmo assim, não consigo abandoná-las. porque, no fundo, tradições também têm um quê de poesia. aquele jantar de família que acontece todo ano, mesmo que seja sempre o mesmo desastre. as brigas, as risadas forçadas, o vinho barato, a comida que não sai como planejado. tudo isso é uma bagunça, mas é a nossa bagunça. é aquele momento em que, por mais torto que seja, você sente que pertence a algo maior, mesmo que esse “algo maior” seja só um grupo de pessoas malucas tentando não se matar antes da sobremesa.
mas o problema é que nem todas as tradições têm essa graça. algumas são só pesos mortos. relíquias mofadas de um passado que já devia ter sido esquecido. tradições que perpetuam preconceitos, que oprimem, que dizem às pessoas como viver, como amar, como existir. essas, eu quero ver queimadas. tradições que dizem às mulheres que lugar de respeito é longe do poder. que dizem aos homens que sentir é fraqueza. que transformam diversidade em ameaça. essas eu quero enterrar, e nem me dou ao trabalho de fazer um funeral bonito.
a verdade é que tradições são uma faca de dois gumes. elas podem nos conectar, nos dar propósito, nos lembrar de onde viemos. mas também podem nos acorrentar, nos impedir de evoluir, nos obrigar a carregar o peso de ideias que já deviam estar mortas e enterradas. a questão é simples: o que vale a pena manter e o que precisa ser destruído?
e aqui está a parte que realmente importa: tradições boas não são estáticas. elas evoluem, se adaptam, se tornam algo maior do que eram. a receita da sua avó pode ganhar novos ingredientes, novos significados. o ritual pode mudar, mas o espírito continua. é isso que faz uma tradição ser viva, relevante. o resto é só entulho emocional.
então, sim, eu odeio tradições. e as defendo. porque elas são um espelho distorcido da humanidade. mostram o melhor e o pior de nós. e talvez seja por isso que, apesar de tudo, eu não consigo largá-las. porque, no final das contas, elas são a cola que mantém tudo junto. mesmo que, às vezes, seja uma cola ruim, cheia de rachaduras.
então aqui vai meu brinde ao ano novo: que a gente saiba o que vale a pena guardar. e que tenha coragem de jogar fora todo o resto. porque o mundo muda. e nós também deveríamos.
a verdade nua e crua é que o mundo ao nosso redor, tudo o que você ama ou odeia, foi feito por pessoas comuns. não gênios, não deuses. pessoas normais. gente cheia de medos, dúvidas, dívidas e, muitas vezes, bêbada ou desesperada. o hambúrguer que você idolatra? criado por alguém que provavelmente tinha a mesma inteligência emocional de um tijolo e só queria pagar as contas. aquele filme que você acha que mudou sua vida? um chute no escuro, reescrito tantas vezes que o roteirista nem sabia mais o que estava fazendo. o prédio onde você vive? uma ideia de alguém que, com sorte, não era incompetente demais pra calcular o peso das vigas.
e ainda assim, essas pessoas fizeram. é isso que me fascina e me dá raiva ao mesmo tempo. elas fizeram. e você? você está aí, sentado, olhando para o mundo como se precisasse de uma permissão oficial pra começar algo. como se houvesse um comitê divino aprovando quem pode ou não criar algo significativo. odeio te dizer isso, mas não há comitê. não há gatekeepers. o que há são pessoas que fizeram porque decidiram fazer. ponto final.
e aqui está a coisa que realmente me dá nos nervos: você sabe disso. você sabe que ninguém que fez algo incrível começou sabendo o que estava fazendo. ninguém. todo mundo começou como um amador, tropeçando, falhando, aprendendo no processo. mas, de alguma forma, você ainda se convence de que não é o momento certo. como se o universo fosse parar de girar e alinhar todas as peças só pra você.
deixa eu ser claro. o universo não liga. ele nunca ligou. o mundo é cheio de gente tentando, falhando e, às vezes, acertando. e, enquanto isso, você fica sentado, acumulando desculpas. “não tenho tempo”. “não sou bom o suficiente”. “não tenho dinheiro”. e a minha favorita, “já tem gente fazendo isso”. claro que tem. sempre vai ter. mas quer saber? ninguém vai fazer do jeito que você faria.
o que me mata é como você consegue romantizar tanto o medo de começar. porque é isso que é, não é? medo de falhar, de parecer idiota, de descobrir que você não é tão especial assim. deixa eu quebrar essa ilusão pra você: você vai falhar. você vai parecer idiota. e, com sorte, você vai aprender alguma coisa com isso.
sabe o que é pior do que falhar? nada. absolutamente nada. a inação é o verdadeiro fracasso. ficar parado, assistindo o mundo girar, esperando por um momento mágico que nunca vai chegar. porque enquanto você está aí, sonhando com o que poderia ser, alguém está fazendo. não porque é mais talentoso ou inteligente que você, mas porque decidiu agir.
e essas promessas de ano novo? uma piada de mau gosto. “em 2025 eu vou…” vai nada. você sabe disso. promessas de ano novo são só uma maneira bonita de adiar o inevitável. é como comprar um bilhete de loteria emocional. você acha que está investindo em algo, mas no fundo sabe que nunca vai dar em nada.
seja honesto. o que realmente te impede? porque não é a falta de tempo, talento ou recursos. é você. é a sua mentalidade. é o medo paralisante de descobrir que você não é tão bom quanto achava. mas aqui está a grande ironia: ninguém é. ninguém começa bom. ninguém começa pronto. mas o que diferencia quem faz e quem não faz é simples. aqueles que fazem têm coragem de começar, mesmo sabendo que podem fracassar.
então, por que não? por que não fazer algo? algo que te assuste, que te desafie, que seja seu. porque, no final das contas, é melhor ser lembrado por algo imperfeito do que ser completamente esquecido por não ter feito nada. a vida não é um ensaio. é agora ou nunca. e a pergunta que você deveria se fazer não é “será que eu consigo?”. é “o que diabos estou esperando?”.